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CAPITULO 01 OS SETE IMPASSES DO CONTROLE DA ADMINISTRACAO PUBLICA NO BRASIL FLORIANO DE AZEVEDO MARQUES NETO, JULIANA BONACORSI DE PALMA ‘Desde = promulgacao da Constituicao de 1988 o Brasil vivencia um movimento &e controle da Administragio Piiblica. ‘Pee =m lado, instituigdes foram criadas com a unica e exclusiva finalidade nos gastos orcamentarios e checar a legalidade no exercicio das jicas. Exemplo disso é a Controladoria-Geral da Unido. Muito embora (CGU se relacione diretamente com a tentativa de elevar a credibilidade no pois o controle interno praticado por um érgao auténomo simbolizaria menos permissiva com atos de corrup¢ao, fato é que a instituigao surgiu ao discurso de controle: maior controle, menor discricionariedade maior lisura publica. Por outro lado, instituigées j4 consolidadas no ‘politico brasileiro foram reconfiguradas praticamente por completo para oideal de controle. E 0 exemplo do Ministério Publico, que, além frente ao proprio Executivo, foi paulatinamente estruturado em termos ‘omgamento, capacitagao de quadros, prestigio e organizacao administra- qual se destaca a artificial construgio da figura do promotor-natural' — para com maior efetividade posstvel 0 controle da Administragao Publica. ‘= Seestecse da figura do promotor natural, a partir de uma astuta interpretagio da Constitui¢ao ver NETO, Floriano de Azevedo. Ente independéncia institucional e neopatrimonialismo: a distorga0 Se promotor natural. In: RIBEIRO, Carlos Vinicius Alves (Org.). Ministério Piiblico: reflexes sobre Sengies institucionais. So Paulo: Atlas, 2010. SesRGos AUCESTO PEREZ. RODRIGO PAGANI DESOUZA (COORDS) 22 | Cexrmote ba apvanisreacto rosuice Some-se a esse panorama institucional a criagéio de mecanismos de controle. Nessa frente, 0 Legislativo desempenhou importante fungao de editar leis que criaram novas acdes, procedimentos, sancdes, competéncias fiscalizatérias e sancionatérias, bem como outras ferramentas de efetivacdo do controle da Administracao Publica. De um modo geral, essa legislacao de controle adveio com a redemocratizacao. Porém, em grande medida esse arcabouco normativo resulta de um estilo de producao normativa, a “legislacao reativa”. Diante de denuncias e crises de ética na esfera administrativa, 0 legislador tende a reagir aprovando a primeira proposta de lei que pareca sanear os costumes da Administracao Ptiblica. Exemplo categérico é o da Lei de Improbidade Administrativa (Lei n° 8.429/92), um claro posicionamento do Legislativo frente ao Caso Collor. Ou a Lei Anticorrupgao (Lei n® 12.846/13), editada em consequéncia dos movimentos de junho de 2013. Em cenérios mais sensiveis, que envolvem comogao da opiniao publica, uma redagao legislativa mais contundente e moralizante que enalteca a cultura do controle tende a prevalecer. Em prol da probidade administrativa, do interesse piiblico, da ética piiblica e de outros valores tao relevantes quanto juridicamente indeterminados, so compiladas impresses em forma de instrumentos juridicos para satisfazer em grau maximo 0 ideal de controle. Muitas — sendo todas — as solugdes juridicas contidas na legislacao de controle traduzem 0 voluntarismo do seu elaborador, afiliado a cultura do controle a qualquer custo, sem andlise prévia da real efetividade das medidas tomadas e dos custos envolvidos, bem como dos impactos sobre a governabilidade e sobre 0 pouco da seguranca juridica que ainda resta. A legislagao de controle estrutura-se na triade “principiologia — sancéo — Prerrogatioas”. A principiologia legitima a conferéncia de prerrogativas de controle a instituicao que goza de boa reputacao, inexoravelmente a instituicdo de controle, valendo-se da san¢ao caso alguma irregularidade seja apurada, Como préprio da legistica brasileira, os preceitos legais séo marcadamente indeterminados e, por decorréncia, significativa esfera de discricionariedade é atribuida ao controlador? Neste texto defendemos a ideia de que a teputacdo modela o grau de poder de uma instituigao.? Uma instituigo com prestigio é capaz de nao apenas maximizar a sua competéncia, mas também assumir as competéncias de outros entes com baixa. reputacao. Aoencarnar 0 discurso do controle e conferir significativa margem de discricionariedade ao controlador, a legislacao brasileira contribui para este quadro. Ressalte-se, porém, que a economia de confianga nao é uma decorréncia direta do Legislativo e nem uma caracteristica tipicamente brasileira; todavia, nao se pode negar a influéncia do Legislativo no contomno dessas inter-relagdes. O que se tem assistido é que o Legislativo, em permanente crise de legitimidade (solapada pela sucessao de escandalos que atingem seus membros e de outro lado pelo colapso da eficacia da atividade parlamentar num mundo de informacao on-line), busca alento de legitimacao transferindo poderes e Prerrogativas para os érgaos de controle, processo que, ao fim e ao cabo, esvazia-lhe * Jé tivemos a oportunidade de trabalhar com maior riqueza de detalhe a extraordindria discricionariedade administrativa conferida a0 controlador pela legislacéo de controle, estruturada em conceitos juridicos indeterminados. Cf, MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Discricionariedade administrativa e controle judicial da administragao. In: Férum Administrativo, Belo Horizonte: Férum, v. 14, 2002. Perfilhamos, assim, a linha da andlise reputacional dos instituiies. Sobre a “reputation-based perspective on regulation”, cf. CARPENTER, Daniel. Reputation and power. New Jersey: Princeton University Press, 2010. meinen oie LEE ee eT EAN (OSSETE IMPASSES DO CONTROLE DA ADMINISTRACAO PUBLICA NO BRASIL = legitimidade. Em outros termos, a modulagio dos poderes fica a cargo da SeaicSo que goza de boa reputacao. "2 Missterio Pubblico ¢ a terceira instituicao mais confidvel do pais, ao passo que Federal ¢ a terceira instituigdo menos confiavel.! Segundo dados da FGV ‘SP emquanto a confianga da sociedade na instituicéo do Ministério Publico 2 4%, apenas uma parcela de 29% confia no Governo Federal.’ Por si s6, Se nao permite explicar 0 cenario de deslocamento politico da competéncia sez considerado em qualquer pesquisa juridica sobre o real controle da Piblica. Contudo, os dados reforgam o pressuposto do presente artigo “@sshuigdes de controle dispdem de um prestigio que falta ao Poder Publico. @2 Gscricionariedade administrativa, a competéncia tende a se deslocar no ‘S@stituigSes com maior reputagio, exatamente aquelas que tém atribuicao 2 atuagao das outras, que tém competéncia para criticar, censurar, sem seomiisso com o resultado de sua atuaciio. Esse processo gerou uma primazia 2 sobre a Administracao Publica controlada. Nao se deve desconsiderar, =. 2 influéncia do discurso do controle da Administragao Publica. projeto preconcebido e de impactos mensurados, a reconfigura¢éo e controle da Administragao Publica apés a Constituicdo de 1988 se deu bor do acaso. A percepcao do Constituinte com relago & Administragao ® istncia controladora, em um primeiro momento, e a opiniao popular So 2 legislagio de controle redigida pelos prdprios controladores, em um os grandes fatores responsaveis pela atual modelagem do controle acdo Publica. Trata-se de um processo aleatério, voluntarioso e Esse crescente ensandecimento do controle acarreta, a nossos ver, sete impasses da Administragao Piiblica brasileira. ‘No ha levantamento empirico que aponte a proporcao e a representatividade ‘Gepesses aqui trabalhados. Todavia, isto néo impede que apontemos situacdes es do exercicio de um controle conformado por: (i) discurso de controle, em ‘“pstituigdes de controle so enaltecidas enquanto se defende menores margens ariedade para a Administrac&o Publica; (ii) economia de confianca, que ‘© deslocamento de competéncias administrativas para as instituicdes de © (ii) auséncia de um projeto de controle, do qual decorre um sistema de fragil, desequilibrado e sujeito a voluntarismos. Como todo impasse, as es aqui detalhadas requerem solugdes em beneficio da governabilidade, da nea juridica e da satisfacdo mais eficiente das finalidades publicas. Acreditamos © Direito tem um papel importante a contribuir nesse sentido. Os impasses aqui dos indicam os caminhos de uma agenda de pesquisa necessaria sobre 0 da Administragao Publica no Brasil.§ Reto IC] Brasil (1° a 4° Trimestre de 2014), ano 6, p. 24. em See. ~ -Miescene-se, nessa linha, o Grupo de Pesquisa de Controle da Administragéo Pablica (GPCAP), coordenado ‘ee Professor Floriano de Azevedo Marques Neto na Faculdade de Direito da USP, que produz pesquisa “empires envolvendo alunos de graduacao e de pés-graduacao acerca do tema do controle da Administracao Pee CE 24 [MARCOS AUGUSTO PEREZ, RODRIGO PAGANI SOUZA (COORDS) CCONTROLEDA ADMINISTRACAO PUBLICA 1.2 Os sete impasses do controle da Administracao Publica no Brasil Impasse n® 1 - Captura das competéncias piiblicas: as competéncias admimistratioas deslocam- com a gestao piiblica) ‘OConselho Superior do Ministério Piiblico do Estado de Sao Paulo edita simulas disciplinando os arquivamentos e recursos em inquéritos civis. E 0 que dispde o art. 206, caput, do Regimento Interno do Conselho Superior do Ministério Publico (Ato n* 005/94 —CSMP, de 18 de outubro de 1994). Na pratica, porém, essas simulas estabelecem uma regulamentacao efetiva da Lei da Acao Civil Publica (Lei n® 7347/85), que tem como uma de suas principais caracteristicas a baixa normatividade” Ademais, diversos outros assuntos de interesse da instituigao tém sua hermenéutica institucional apresentada em stimulas, a exemplo da Stimulan® 13, que trabalha a questo do conflito de competéncias entre o MPE e o MPF no caso de uso de praia ou de terrenos de marinha pela Uni A Sula n? 36 do parquet paulista disp6e exatamente sobre o controle do MPE sobre a Administracao Publica estadual: Sempre que constar a lesao, ou a ameaca a interesses difusos ou coletivos, o Orgao do Ministério Pablico podera apurar se houve a devida atuacao do érgio da Administragio Publica para fiscalizagGo e implementagao das leis de policia administrativa incidentes. Em casos de pouca repercussdo ou grav © arquivamento do inquérito civil poder ter como fundamento a suficiéncia das medidas administrativas para cessa¢ao dos danos ou eliminacdo da ameaca, comprovadas nos autos do objeto de Termo de Ajustamento de Conduta. No caso de omissio injustificada por parte da Administragao Paiblica, o Orgao do Ministério Piiblico poderd tomar as medidas cabiveis para apurar eventuais atos de improbidade administrativa, falta funcional e/ou crime contra a administracao piiblica, buscando a responsabilizagao dos agentes omissos. Da mesma forma, verificaré a necessidade de ajuizar ago civil publica contra a Administracao Publica para compeli-la a aplicar a lei de politica pertinente. Em resumo, a justificativa da stimula aproxima o poder de policia ~ atividade tipica da Administragio Publica — com a defesa dos interesses difusos para, assim, ampliar o controle do MP sobre o Poder Piiblico por meio da celebragao de termo de ajustamento de conduta ou pelo ajuizamento de acao civil publica. Em se tratando de “omissao injustificada”, 0 MP também se encontraria legitimado para apurar ato de improbidade administrativa segundo o regime da Lei n® 8.429/92, falta funcional, bem como crime contra a Administracao Ptiblica. A despeito de ser expressamente registrado nao caber “ao Ministério Ptiblico substituir-se ao Poder Piiblico no exercicio do poder de policia”, situades ha em que o MP serd instado a “promover a tutela do interesse difuso ou coletivo no caso conereto, em face da empresa ou particular responsavel” 7 Para uma analise de como a Lei da Agio Civil Piblica fortalece as instituigSes de controle, c= SUNDFELD, Carlos Ari. Administracao e justica: um novo equilibrio? In: SUNDFELD, Carlos Ari. Direito administrate pans céticos. 2. ed. So Paulo: Malheiros, 2014. Segundo o autor, “a lei da Aco Civil Pablica é curta, relativamente trivial, com aparéncia de simples apanhado de regras de processo civil (quem prope a aco, o que pode pedir, como €a decisio, seus efeitos, e pouco mais). Mas ela mudou o direito e a gestio pablica de forma impressionante. A partir dela, a Justica foi sendo intensamente acionada para discutir demandas de peliticas publicas, para todo tipo de pressao contra érgaos piiblicos ou contra particulares, para medidas interventivas variadas, indenizagées e assim por diante. O foro judicial se poitizou, a Administragto e o Legislative perderame claramente 0 ‘monopélio do interesse piblico. Mais im capitulo da instigante judicializagio da vida”. Idem, p. 334. ROMANO DE AZEVEDO MARGUES NETO; HEIMA SOMACOESIDREALMA. | 95 (OS SETE IMPASSES DO CONTROLEDA ADMINISTRAGAO PUBLICA NO BRASIL > for “injustificada” - na visio do MP ~e houver “interesse social”, o MP legitimado para “promover diretamente e desde logo a tutela do interesse coletivo”. As escusas da Administragdo sao pontualissimas: auséncia de ss=base 0 exercicio do poder de policia ou a omissdo como uma das op¢ées ente determinadas pelo legislador, desde que seja “razodvel” — novamente, = perspectiva do MP. Para tanto, a justificativa da Simula n° 36 do CSMP-SP 2 dlassica visio de que nao ha discricionariedade no exercicio do poder de sss dever-poder de agir em beneficio do interesse puiblico. "Sesto pontual exemplo, que merece ser analisado mais profundamente em sspecifico, depreende-se 0 deslocamento do exercicio do poder de policia sdministrativa para a instancia controladora. A Stimula n® 36 do CSMP-SP € que a formalizaciio de uma pratica estabelecida na instituicao que, pau- determina o empoderamento do MP perante a Administracao Publica, s qualificado. Ha o dever de agir. Esta aco é vinculada. Seria este deslocamento ‘empeténcia saudavel A governabilidade? £ 0 MP o ente com maior capacidade scional para dispor sobre a regulacao (afinal, é disto que se trata)? n®2—Neopatrimonialismo: o controle é orientado pelas predilecdes pessonis e orientacio ca do funciondrio controlador Hé uma tendéncia na comunidade juridica de se reconhecer ampla autonomia ada pessoa que exerce a funcao de controle, sem qualquer subordinagao organica SestituigGo de controle. Corolério dessa visio é a doutrina do promotor natural, que outra oportunidade descrevemos como a doutrina “que tem por fundamento a entificagio de um princfpio implicito no texto constitucional, passa pelo alargamento sua aplicagio e, ao final, acaba por identificar tal principio como um direito subjetivo @ cada promotor, como fundamento para sustentar a plena autonomia e a auséncia @ subordinacio organica do membro do parquet” * Por trés da ideia de que a ordem “eestitucional assegura o principio do promotor natural figura 0 neopatrimonialismo, = seja, 0 interesse do membro do Ministério Pablico de apropriar subjetivamente as competéncias institucionais para assim exercé-las como ilhas de poder © CEMARQUESNETO, Floriano de Azevedo. Ente independéncia institucional eneopatrimonialismo:a distorgo a doutrina do promotor natural. In: RIBEIRO, Carlos Vinicius Alves (Org.). Ministerio Piblico: reflexes sobre principios e fungées institucionais. Sao Paulo: Atlas, 2010. p. 135. * idem, p. 136. MARCOS AUGUSTO PEREZ. RODRIGO PAGANI SOUZA (COORDS) 26 | Connon Da ADnENSTEAGAO PUBLICA Sem a pretensao de debater a juridicidade do principio do promotor natural ou de qualquer outra concep¢ao criada pela doutrina engajada para fundamentar a ampliagao dos poderes de controle sobre a Administragéo Publica, importa enfatizar a caréncia de orientacdo institucional sobre a dinamica do controle. Raros so os direcionamentos institucionais que, a um s6 tempo, uniformizem 0 modo de exercicio da fungao de controle por seus membros e, mais importante, confiram 4 Administracao Puiblica e A sociedade em geral balizas para adequacao comportamental. Trata-se de uma distorcdo do sistema de controle que nao apenas mina a seguranca juridica na tomada de decisdes pelo Poder Publico, mas especialmente incentiva o florescimento de impetos voluntaristas que, nao raro, desaguam em episédios de abuso de poder. Quer-se moldar a gestdo publica ~ diga-se, contratos publicos de infraestrutura de alta complexidade, politicas pablicas construidas em proceso administrativo aberto 8 participagao administrativa, regulagio precedida de andlises de custo-beneficio e de impacto regulatério e decisao quanto alocacao dos parcos recursos publicos, por exemplo — a visdo particular da pessoa do controlador. Divergéncias decisérias podem ser salutares na esfera de controle. Na verdade, 6 aprimoramento institucional esta diretamente relacionado & pluralidade de ideias para posterior refinamento das decisées institucionais. Diante da novidade do tema das compras publicas sustentAveis, por exemplo, o TCE-SP teve orientagdes diferentes quanto & aquisigio de equipamentos de informatica com certificagio TCO.” Para uma primeira corrente, este tipo de certificagao era legitimo considerando a defesa do meio ambiente e a manutengao da competitividade." Para outra, porém, esta certificacao acarretaria Onus desnecessario aos participantes, além de inexistir érgaos responsaveis por esta normatizacio técnica no Brasil.” Apés esse enfrentamento inicial, o TCE-SP sinalizou que o uso de certificacao em certames para aquisicdo de equipamentos de informatica era legitimo. Os argumentos compartilhados pela maioria de seus membros poderiam se traduzir como posicionamentos institucionais, especialmente nos drgaos ¢ entes colegiados, apés uma genuina deliberacao cooperativa, sem espaco para ilhas." Impasse n® 3 ~ Desvirtuamento da atividade-fim: os gestores ptiblicos priorizam mais atender as demandas dos controladores do que cumprir com as atividades-fim da Administragao Piiblica O controle pauta a gestio publica? A indagaco que propomos poderia soar, até pouquissimo tempo atrds, absurda. O protagonismo do Executivo sempre foi dbvia constatacéo de cientistas politicos que se debrugavam sobre o sistema politico brasileiro." Teria, na acepgio técnica, o “poder de agenda” sobre o Congreso Nacional,'* resultado de um presidencialismo de coalizacao que supervaloriza o papel do Poder ® Cf PALMA, Juliana Bonacorsi de; NOVAES, Nelson. Compras piblicas sustentaveis. Brasilia: SAL, 2013. (Série Pensando o Direito. v. 49). Disponivel em: . Acesso em: 10 dez. 2015. Cf, TC-036246/026/11, Rel. Cons. Robson Marinho, j. 23.11.2011. % Cf, TC516/008/11, Rel. Cons. Antonio Roque Citadini, Tribunal Pleno, j. 15.06.2011. © C& MENDES, Conrado Hubner. Onze Ithas. Disponivel em: . Acesso em: 10 dez. 2015. 4 CE LIMONGI, Femando; FIGUEIREDO, Argelina. Bases institucionais do presidencialismo de coalizagio. Lua Nova, v.44, 1998. Cf. LIMONGI, Fernando. A democracia no brasil. presidencialismo, coalizao e processo de. = CEBRAP, Sio Paulo, v. 76, 2006. is6rio. Novos Estudos OMANODE AZEVEDO MARQUES NETO JULANABONACORSIDEPALMA | 977 (6 SETEIMPASSES DO CONTROLE DA ADMINISTRAGAO PUBLICA NO BRASIL Nes debates juridicos, a supremacia do Executivo frente as instancias de én é enfatizada. Carlos Ari Sundfeld e Liandro Domingos, por exemplo, = tese de Oscar Vilhena Vieira de que o Supremo Tribunal Federal estaria peculiar arranjo politico brasileiro (Supremocracia).'* Para os autores, é Paiblica a figura central na medida em que concebe novas formulas ‘eplementa politicas piiblicas e define limites aos direitos, ou seja, cria um novo (Administrocracia)."” Nessa perspectiva, a instancia controladora eedjuvante de um fenémeno transformador inato ao Poder Piblico. Sscordar de que a Administragao Publica exerce sempre algum protagonismo, Sexo mais detida a respeito do debate tragado. O controle da Administrago =randeceu, assim como as instdncias de controle se tornaram mais ativistas. ‘es exemplos de paralizago de obras publicas pelos Tribunais de Contas, de complexas decis6es regulatérias por liminares e determinagées de fazer — o de presidios, escolas ptiblicas ou hospitais — ou de pautas regulatorias do Ministério Publico por meio de termo de ajustamento de conduta. Nao So do Direito Administrativo brasileiro elaborar doutrinas mitigadoras do como a reserva de administracao ou a deferéncia administrativa."* O controle sobre a atividade-fim da Administracao Publica, direta ou indiretamente. ‘Deretamente, o controlador toma a decisdo administrativa no lugar do gestor. esta avocacio e, af sim, torna o administrador mero brago mecAnico (nao do Svo, mas das instdncias de controle). E o proprio controlador que modela a fim, ou seja, 0 especifico modo de satisfacao das finalidades ptiblicas por meio dos concretos. Varios so os exemplos recolhidos da pratica administrativa, minagdes de aumento de vagas em creches puiblicas, de construcao de novas des puiblicas ou de insergao ou supressao de clausulas contratuais. A depender do imcisiva for sua intervengao, o controlador se coloca como colaborador do gestor exexcicio das competéncias administrativas (relagio de controle por cooperagao) ou, toma o lugar do gestor por completo (relagdo de controle por substituigio). Note-se equi, limitadissimo é 0 espaco de inovagao ou de protagonismo da Administracao a: ela se resume a responder as demandas do controlador. Ocontrole também pode atingir indiretamente a atividade-fim da Administragao <2, pois, embora a ela nao seja direcionada, termina por impactar a conformacao exercicio das competéncias ptiblicas. O ideal do controle de resultados ainda nao "Sesou a Administracio Publica brasileira. Diuturnamente os gestores sao demandados ‘seiss instancias de controle a responder quesitos relativos a processos de auditoria e © VIEIRA, Oscar Vilhena. Supremocracia. Revista Direito GV, v. 8, jul./dez. 2008, © GE SUNDFELD, Carlos Ari; DOMINGOS, Liandro. Supremocracia ou administrocracia no nowo direito publico Srasileiro? In; ALMEIDA, Femando Dias Menezes de. (Org. et al. Direito plblico ew exelgie? Estados em ‘momenagem a professora Odete Medauar. Belo Horizonte: Forum, 2013. p. 36. © Saliente-se, porém, que esté em construcio uma linha de estudo sobre os limites do controle fascial da Adii- sistragao Publica, considerando a capacidade institucional do Poder Péblico frente ao fadicsirio para exercer 2 fungdo piblica e, assim, tomar as decisbes de alto impacto social e econmico, como questtes distributivas, excolhas regulatérias e desenho de politicas piiblicas. Dentre os trabalhos de maior projecSomo Direito Admi- nistrativo brasileiro, indicamos o de VERISSIMO, Marcos Paulo. Controle judicial da atiwidiade normative das agéncias de regulagao brasileiras. In: ARAGAO, Alexandre Santos de (Org,). Poder mormatinw desapiacs regu lagao. Rio de Janeiro: Forense, 2006. Trata-se de uma linha de investigacao cientifica que tende # se desenvolver cotejando nao apenas 0 controle judicial da Administracao Pablica, mas toda a sistematice Ge controle. 28 | MisosaucusTo riz RODRIGO PAGANIDE SOUZA (COORDS) CONTROLE DA ADMINISTRACAO FUBLICA de fiscalizagao, especialmente com relagao ao Tribunal de Contas. Muito embora este nao seja um cenario espalhado em toda a maquina burocratica estatal, nao sao poucos 0s érgios e entes ptiblicos que se ressentem da montanha de demandas burocraticas que os controladores requerem. Entre alocar o tempo escasso — assim como os recursos publicos ~ em modelar contratos administrativos, conduzir procedimentos, elaborar politicas publicas, fomentar o didlogo com a sociedade por meio de audiéncias e de consultas piblicas e responder aos controladores, a resposta é inequivoca: os gestores priorizam as demandas dos controladores. Pode-se argumentar que este seria o custo da democracia. Preferimos, porém, aprofundar a reflexao ressaltando os possiveis efeitos do impacto da sobreposigao de instituig6es de controle na gestao publica. O principal aspecto j4 foi mencionado e corresponde ao fator tentpo. Demandas excessivas dos controladores - talvez ensejadas por uma possivel presuncao de ilegitimidade da atuacao administrativa— podem tornar a gestao publica mais morosa e ineficiente. Isso porque 0 tempo que seria dedicado a atividade-fim desloca-se para atender aos questionamentos dos controladores. Dois efeitos comportamentais podem decorrer da passagem de uma checagem de regularidade para uma dindmica mais cooperativa entre Administragao e controlador. Primeiramente, o gestor ptiblico pode ser estimulado a decidir de modo insuficiente, esperando um posicionamento das instituicdes de controle para, entao, apresentar a verso final da decisao. Tal se verificaria, por exemplo, com a indefini¢ao de pontos estruturantes de uma politica publica, como a margem de atendimento dos beneficidrios, esperando-se uma posi¢ao mais firme do Judiciario, do Ministério Puiblico, da Defensoria Publica ou do Tribunal de Contas sobre a questo da igualdade nesta especifica politica publica. Em segundo lugar, o proprio gestor tende a levar a decisao administrativa para andlise do controlador. Esta estratégia nao é estranha a gestio publica, bastando-se mencionar 0 valor das ages declaratérias de constitucionalidade em casos sensiveis.” Em ambos os casos, 0 processo decisério cooperativo entre Administracao e controlador aproxima-se do ato administrativo complexo, consagrando 0 deslocamento de parcela da competéncia administrativa para a instituicao controladora. Trata-se de uma realidade com a qual o Direito necessita lidar na medida em que balizas como eficiéncia,” legitimidade”' e atendimento as finalidades ptiblicas® ganharam significado juridico.* Na medida em que se expandem os limites do controle da Administracao Publica, em que nao sao dificeis os exemplos de posturas ativistas das instancias de controle, os gestores publics passam a se ocupar substancialmente Cf. Caso Apagao apreciado pelo STF na ADC (MC) n° 9, em 2001 ® Expressamente previsto no art. 37, caput, da Constituicdo Federal ® Expressamente previsto no art. 70 da ConstituicSo Federal ® Expressamente previsto no art. 28, caput, da Lei 9.784/99, ® De fato, é a atividade de controle uma atividade publica. Nessa perspectiva, deve o controlador exercé-la dentro dos quadrantes de qualquer outra atividade administrativa ou jurisdicional, prezando, inclusive, pela eficéncia. E nesse sentido que afirmamos que o controle deve ser responsivo, com um claro viés pragmitico ou consequencialista, devendo sempre mensurar os efeitos do controle da Administracio Pablica. “A Administracio blica somente é eficiente se além de ndo desperdicar recursos piiblicos (evitando 0 desvio ou o desperdicio) ela logra atender as necessidades coletivas que correspondem a finalidade do agir administrativo. Qualquer controle que, sob o palio de coibir o desvio ou o desperdicio, impede a consecucao de uma acio administrativa acaba por produzit um efeito contrério aquele que justifica a existéncia do controle”. MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Os grandes desafios do controle da administracio publica. Férum de Contratacio e Gestio Publica, Belo Horizonte, v. 100, 2010. See eee 2 em atender &s determinacGes dos controladores, sendo integralmente. Formalmente, a Administragao ainda pauta o sistema politico brasileiro. No entanto, o quanto desta pauta é genuinamente construcio origindria do Poder Ptiblico? Quanto dessa patita se distancia do didlogo com os controladores? Futuros estudos poderao apontar 0 quanto as instancias de controle influenciam, direta ou indiretamente, no poder de agenda do Executivo. Impasse n® 4 — Renis efeitos do combate & corrupeao: a cultura do controle & realmente eficaz no combate a corrupeao? Tradicionalmente o sistema brasileiro de direito administrativo confere significa- tivo valor hermenéutico e operacional 4 doutrina, apesar de estudos demonstrarem a relevancia de outras fontes juridicas na construgao do direito administrativo, com especial destaque para a legislacdo e a jurisprudéncia. As doutrinas retinem as ideias juridicas sobre o funcionamento da maquina estatal (e seu relacionamento com a sociedade e demais organizagées, estatais ou nao) com a finalidade de apresentar uma sistematizac&o coesa e harménica dos postulados da legalidade administrativa pela invocagao de princfpios universalizantes. De um modo geral, os controladores tomam as doutrinas como efetioas fontes juridicas. Um ponto de fundamental importancia consiste, portanto, em saber como esses argumentos doutrindrios sao construidos.* Apesar de o direito administrativo brasileiro ter sido originalmente desenvolvido a partir da andlise do funcionamento concreto da Administracao Publica, a relagao entre andlise juridica e gestao publica se perdeu no caminho, dando lugar a abstraciio e ao apego aos tipos ideais na elucidagao dos argumentos doutrindrios. Esta guinada metodolégica nao pode ser explicada a partir de um ou outro fator isolado, senao pelo complexo pano de fundo que se apresentou no Brasil nas décadas de 1950 e 1960. Sem a pretensdo de esgotar todos os elementos que corroboraram para uma teoria abstrata ¢ tipolégica do direito administrativo — 0 que nao seria satisfatoriamente apresentado nos limites deste texto —, indico aqueles aspectos que considero serem decisivos, quais sejam: a consagracao da teoria pura do direito de Hans Kelsen como a lente de leitura do fenémeno administrativo; 0 acolhimento do modelo racional-legal de burocracia concebido por Max Weber como paradigma de leitura da Administracéo Publica brasileira; 0 alinhamento doutrinario ao positivismo juridico; e a busca cientificista da qual as ciéncias humanas como um todo partilhavam. Por isso afirmar que a teoria do direito administrativo é em grande parte construida a partir de truismos doutrindrios. ‘Truismos nada mais sao que “verdades declaradas”, dbvias e banais, que possam ser facilmente verificadas e validadas. Sao os lugares-comuns que a doutrina naturalmente reverbera. Muitas das afirmages mais categéricas do direito administrativo sao emba- sadas em truismos, e ndo em uma investigagao empirica que conduza a enunciagao de parametros. A cultura do controle, que impulsiona as instituigdes controladoras, é estruturada a partir de truismos construidos segundo experiéncias institucionais ou pessoais em conjunto com a doutrina de direito administrativo. (© ponto € aprofundado por Carlos Ari Sundfeld no texto Conversando sobre direito ad SUNDFELD, Carlos Ari. Direito administrativo para céticos. 2. ed. S40 Paulo: Malheiros, 2014 30 | ABcos Aucuso rez coo SERS Um exemple necorrente deste tipo de trufsmo doutrindrio — raras vezes enunciado, porém —corresponde a presuncio de corrupcio no exercicio da discricionarie- dade admimistratioa, contrariando o principio da presuncao de legitimidade da atuacao administrativa® (também outro truismo, mas um truismo francés). Se perante 0 cidadao 0 ato administrativo é presumidamente considerado valido e legitimo até prova (cabal) em contrario, perante a agao do controlador este mesmo ato presumidamente ilegitimo, prenhe de suspeitas de desvios. Isso fica claro no controle pelo Judicidrio que muita vez em sede de mandado de seguranca tende a prestigiar 0 agir administrativo, recusando-se a ver nele ilegalidade ou abusividade, mas, ao depois, passado curto periodo, diante do questionamento pelo Ministério Piiblico, inverte 0 sinal e passa a tratd-lo ato como suspeito, pressupostamente ilegitimo. A Constituicao de 1988 confere extenso rol de competéncias ao Poder Ptiblico em favor dos valores ptiblicos por ela tutelados. Segundo a doutrina cldssica, o Poder Ptiblico detém o dever-poder de prestar servicos publicos e realizar tantas outras atuacdes administrativas que sejam necessérias & satisfagao do interesse publico. Porém, amaior parte da doutrina é refrataria a conferéncia de amplas margens de discricionariedade & Administragao Piablica, mesmo sabendo que a discricionariedade permite uma prestacio mais eficiente de servicos puiblicos. Eis 0 receio fundado em Montesquieu: todo aquele que detém poder tende a abusar dele. E, para a maior parte da doutrina, 0 Executivo tende a atuar ilegalmente quando age de modo discricionério. Trata-se da presuncao de ilegitimidade do Poder Publico. E curioso observar que essa expressiva corrente doutrindria demanda a expansao organica da maquina administrativa e a prestagio de servicos puiblicos, mas, ao mesmo tempo, defende a discricionariedade minima. As decisées substantivas devem ficar de fora da Administragao Publica, no Legislativo para ser mais especifica. Para a defesa dos direitos individuais frente ao Poder Publico, a doutrina administrativista termina por recriar um liberalismo paternalista peculiar ao sistema brasileiro. Hoje sao quatro os grandes truismos que embasam a cultura do controle: 1. Quanto maior a margem de liberdade conferida aos gestores piiblicos para atuar (discricionariedade), maior o risco de corrup¢ao; 2. Quanto maior a incidéncia de controles, maior a certeza de que a Administragio atue dentro dos quadrantes da legalidade; 3. Instituigdes de controle fortes, dotadas de irrestrita independéncia funcional e avantajados recursos, barram a corrup¢ao; 4. A corrupcao na maquina publica é contida por meio de punicdes exemplares: 6 0 efeito simbélico de sangdes pesadas que constrange novas praticas delitivas e infracionais piblicas. Em uma primeira andlise, ninguém ousaria a se contrapor as ideias fundamentais que embasam essas afirmagoes. Hé uma concordancia geral de que o Poder Piiblico deve exercer as suas competéncias em conformidade com as regras juridicas, endo segundo o seu alvedrio. As instituicdes de controle devem gozar de capacidade institucional para bem exercerem suas fung6es. E as sanges podem inibir atos de corrup¢io. Todavia, qualquer uma dessas quatro afirmagGes carece de comprovacSo empirica quanto a ® ‘Sobre o tema, cf. SCHIRATO, Vitor Rhein. Presungio de iepitimidadie dis atos administrativos © processo administrativo. Revista de Direito Administrativo Contemporiines, Sio Pasi, ©. 1. 203. LORLANO DE AZEVEDO MARQUES NETO, JULIANA BONACORSIDE PALMA cossereiesssts pocontmott ba amuasreacorenuca soonast, | 31 efetividade da promessa, bem como a andlise de custo-beneficio sobre a alocagao de recursos puiblicos. E, lembremos, controle custa. O sistema de controle é formado por leis prenhes de principios, que conferem ampla margem de atuagdo dos controladores e limitam significativamente a gestio publica. Basta mencionar a Lei de Licitacdes (Lei n® 8.66/93), de teor analitico e cujos preceitos reduzem significativamente a discricionariedade nas contratagdes ptiblicas. Ela tem funcionado? Serd que, de fato, ha menos casos de corrupcao em razao dessa estrutura normativa? Ou o fato de uma lei detalhista, formal e burocratica facilita a corrupgio? Nunca antes as instituigdes de controle estiveram tao capacitadas, dispuseram de tantos recursos e teses que, corroboradas pela comunidade juridica, alicergaram tamanha independéncia funcional a cada membro seu. Mas isso tem funcionado? Em que medida esse “poder” institucional tem servido mais ao combate A corrupgao que ao atendimento de interesses das préprias corporagées incumbidas do controle? Qual é a métrica entre os custos (estrutura de organizacao, servicos técnicos auxiliares, vencimentos, beneficios, custas processuais etc.) e a efetividade da funcao desenvolvida? Em todas as instancias, as burocracias incumbidas do controle sao as mais preparadas, mais aparelhadase mais bem remuneradas do servico publico. Normalmente seus agentes ascendem as carreiras do controle apés percorrerem uma sucessiio de concursos ptiblicos. Em pouco tempo de carreira sua remuneragao chega préxima ao teto da respectiva esfera federativa. O emprego estavel, auténomo e remunerado no maximo possivel acarreta uma inefavel pulsdo por protagonismo. Por um lado, os agentes do controle se consideram, nao sem raziio, os vencedores de um rigoroso processo seletivo. Sentem-se verdadeiros solados espartanos da burocracia publica. O que lhes confere uma postura um tanto desconfiada daqueles que, por eleicao ou nomeacao, exercam funcao ptiblica sem passar em concurso piblico de provas e titulos. Estas burocracias dao pouco valor a politica e aos mecanismose legitimagao democratica, tidos como menores face & legitimagao pela vitéria no concurso puiblico. De outro lado, uma vez tendo atingido o cume da remuneracao do servigo publico, buscam compensagées extraecondmicas, como a visibilidade pitblica, uma referéncia elogiosa na grande imprensa, o reconhecimento nas redes sociais. Estes fatores produzem uma verdadeira disputa correicional, uma espiral de superacao do rigor, onde os controladores buscam parecer mais rigorosos que seus pares. Tudo em busca do protagonismo. Sem muito compromisso com o resultado. O que designamos por “gincana de corrigendas nao responsivas”. ‘Nao hd estudos empiricos sobre qualquer uma dessas afirmativas. Sao truismos vencedores na formagao do sistema de controle. Nao sabemos se menor discricio- nariedade, mais regras, mais punicao e maior independéncia as instituigdes de controle so os melhores meios para combater a corrup¢ao no Brasil. Estamos no escuro. Impasse n® 5 — Gestiio de defesa: 0 administrador de boa-fé 6 refém do controle A gestdo publica é, antes de tudo, uma atividade complexa. Mais complexa ainda se torna com a escassez de recursos publicos, nota caracteristica sensivel da burocracia brasileira. Os desafios de atender as necessidades pitblicas e de otimizar a aco piblica dentro da reserva do possivel requerem um comportamento proativo do gestor ptiblico. Solugdes criativas, protagonismo no enderecamento de problemas peculliares e estabelecimento de parcerias sao atitudes apreciadas na gestao publica moderna. Porém, uma gestao publica proativa como a descrita apenas se faz possivel 3g. | MARCOSAUGUSTOFEREZ, RODRIGO PAGANI DESOUZA (COORDS) | CONTROLEDA ADMENISTRACAO PUBLICA com relativa discricionariedade, que permita uma modelagem inovadora das decides piiblicas para que se tornem as mais eficientes possiveis. Apesar de gestores publicos proativos estarem de boa-fé e visarem 4 efetiva satisfagdo do interesse puiblico, eles tém recorrentemente esbarrado nas distorgdes do controle formal. Sendo impedem por completo 0 exercicio de competéncias de modo criativo, este tipo de controle, ainda prevalecente, desincentiva a gestao publica proativa, pois os gestores tém receio de serem pessoalmente responsabilizados por aco criativa tida como ilegal na visio do controlador. Pela presuncao de ilegalidade da Administracao Publica, em regra compartilhada pelas instituicdes de controle, qualquer medida administrativa mais arrojada é vista com desconfianga. A burocracia dispée de uma cultura prépria, da qual decorrem rotinas usualmente praticadas pelos funcionérios ptiblicos. Espera-se que o Poder Piiblico atue de modo uniforme, conformando-se a letra da lei. Esse seria o papel da Administragao Puiblica como braco mecanico do Legislativo. E a maxima: “administrar é aplicar a lei de oficio”. O controle formal vé interesses escusos em qualquer ac4o administrativa que destoe das férmulas rotineiras. Porém, nem sempre a lei ira dispor sobre o especifico problema vivenciado em uma determinada comunidade carente que demanda pronta atuagao do Poder Puiblico. Nem sempre o legislador conseguiré se pronunciar sobre todos os aspectos de um determinado setor regulado. Nem sempre haveré lei. Muito ja se debateu sobre os limites da lei formal na atuagéo administrativa. Reafirmamos que poucas serao as ocasiées de vinculacdo completa da Administracdo & lei. Notéria é a estruturacdo do texto legal em standards para posterior regulamentagaio pelo Poder Ptiblico, inclusive com expressa delegacdo normativa. Assim se faz em razo de fatores como assimetria informacional, inviabilidade fatica de esgotamento de todas as hipéteses de aplicacao legal e a necessidade de formac&o de consensos durante o processo legislativo, por exemplo. Administrar é decidir dentro dos limites legais; a discricionariedade é intrinseca a atividade de gestdo priblica. Hoje os gestores temem exercer a discricionariedade. Preferem seguir os mo- delos e as rotinas burocraticas a inovar. Temem o risco de serem responsabilizados pessoalmente por uma decisao criativa, mas lida como improba pelo controlador. Via de regra, os gestores preferem realizar um certame licitatério ainda que 0 caso concreto admita dispensa ou inexigibilidade. Receiam que a motivagao para contratacao direta nao seja compartilhada pelos controladores e, assim, responderem pessoalmente pelo “ilicito” . Vale o risco pessoal? Essa é a pergunta que os gestores ptiblicos de boa-fé se fazem. Osistema jurfdico nao tutela o gestor publico bem-intencionado que queira atuar de modo proativo, buscando solugées criativas e parcerias para uma gestao publica mais eficiente.* Que pode até errar, pois 0 erro faz parte do aprendizado, mas que erre com boa-fé, sem qualquer desvio de finalidade ou abuso de poder. Desse modo, pratica-se % Inexiste preceito normativo que expressamente assegure que o gestor puiblico de boa-féndo seré responsabilizado pessoalmente por suas decisdes ou opinides técnicas. Uma tentativa de superar esse impasse e efetivamente tutelar o gestor piiblico honesto encontra-se no PLS n? 349/2015, que visa a alterar a Lei de Introdugao as Normas do Direito Brasileiro para conferir maior seguranga juridica nas relagdes com 0 Governo, cujo proposto art. 27, caput, em a seguinte redacao: “O agente puiblico respondera pessoalmente por suas decisbes ou opinides técnicas em caso de dolo ou erro grosseiro”. Nessa linha, indica no §1° do preceito: “Nao se considera erro grosseiro a decisdo ou opinido baseada em orientagio geral, ou ainda em interpretagao razoavel, em jurisprudéncia ou ‘em doutrina, ainda que nao pacificadas, mesmo que venha a ser posteriormente aceita, no caso, por drgaos de controle ou judiciais”. FLORIANO DE AZEVEDO MARQUES NETO, JULIANA BONACORSIDE PALMA ‘OSSETEIMPASSES DO CONTROLE DA ADMENISTRAGAO PUBLICA NOBRASH. | 33 hoje uma gestiio priblica de defesa em detrimento da gestao piiblica proativa, pois a motivacdo é antes enderecada ao controlador que & situacdo concreta que enseja a atuacao administrativa. Nao é incomum que o gestor piiblico hoje empenhe mais tempo em se proteger do controle do que em busca solugées para prover as necessidades coletivas. E a Administracao Publica a principal intérprete da lei, pois aplicar a lei é inter- pretar a lei. E esta hermenéutica administrativa considera as especificidades do caso concreto, a expertise, o conhecimento do mercado ou da comunidade em que a decisio administrativa sera aplicada, bem como outros aspectos que saltam aos olhos dos gestores ptiblicos, mas podem passar desapercebidos pelos controladores. O intérprete primeiro das normas administrations é a prépria Administragio Piiblica, e néo 0 controlador. Desde que de boa-fé, a interpretacao legal dada pela Administracao Piiblica no sentido de criar solugdes inovadoras e criativas — mais eficientes, portanto -, deve merecer deferéncia pelos controladores. Apenas assim os gestores ptiblicos serdio menos receosos e mais criativos. Impasse n® 6 — Competigao institucional: os érgaios de controle competem entre si Uma das caracteristicas do sistema de controle da Administracao Publica é exatamente a sobreposicio das instituicdes de controle. Diversos sao os contornos da gestio puiblica que podem ser controlados, concomitantemente, por mais de dois controladores. Ocontrole das contratagGes puiblicas, por exemplo, é realizado a um s6 tempo pela CGU, pelo MP e principalmente pelo TCU. O Judicidrio também pode entrar em cena se algum interessado levar a contratagao publica (licitago ou contrato) a apreciagao do Poder Judiciério. Nessa linha, a corrupcao também congrega a atuacao de todos os referidos controladores. Hi, indiscutivelmente, um excesso de controle. Os custos relacionados a esse controle ~ sejam aqueles relacionados ao funcionamento dos controladores, sejm aqueles oriundos da prépria atividade de controle ~ sao significativos. Apesar da convergéncia de instituigdes de controle sobre a gestdo ptiblica, dtividas se colocam quanto a efetividade do controle, notadamente quanto ao seu efeito simbélico de reprimenda de novas praticas ilicitas. Poucas sao as iniciativas de cooperaciio entre os entes de controle. Os acordos de cooperagao técnica existentes se voltam, de modo geral, & troca de informacoes ¢ realizacao de trabalhos de auditoria e instrugéo processual conjuntas.” Em outros termos, a cooperagao existente entre as instituicbes de controle concentram-se na investigacao, preservando-se a autonomia de cada ente para conduzir 0 processo de responsabilizacao em seus correspondentes ambitos. Os acordos de cooperagao tem © potencial de “autorregular” os controladores celebrantes quanto ao exercicio de suas competéncias em um especifico caso, especialmente naqueles de grande repercussio publica, garantindo-se, assim, maior seguranca juridica no controle da Administracio Publica. CE, por exemplo, 0 Acordo de Cooperagio Técnica e Assisténcia Mittua celebrado entre o Ministério Piblico Federal e 0 Tribunal de Contas da Unido em 9 de outubro de 2012. Disponivel em: . Acesso em: 20 dez. 2015. Ainda, cf. 0 Acordo de Cooperacéo Técnica celebrado entre a Controladoria-Geral da Tribunal de Contas da Unio em 05 de abril de 2010. Disponivel em: . Acesso em= 20 fportal/file ‘Mancos AUGUSTO PEREZ RODRIGO PAGANI DE SOUZA (COORDS) 34 | Coctoutonapunsiacho rnc Tampouco a preferéncia do controle é fixada por lei. A Assembleia Nacional Constituinte nao tinha um projeto com relagao ao controle da Administragao Publica, mas apenas duas grandes diretrizes que se aplicam: (i) ampliagao das instancias de controle e (ii) robustecimento do controle da Administracao Piiblica. Nao se verificou um projeto de organizacao institucional para exercicio harménico das fungdes puiblicas, como a definicao de que a Policia investiga e- 0 Ministério Piiblico acusa® (ainda que esta sequéncia seja hoje desafiada). Desse modo, a Constituico Federal nao estabelece qualquer ordem de primazia no exercicio da competéncia de controle do Poder Pablico entre as diversas instituicdes que concorrem entre si. Esse impasse pode gerar sérias consequéncias, comprometendo-se a seguranca juridica, a qualidade das apuracées e a capacidade de a Administragio efetivamente cumprir com suas missdes ptiblicas. Bom exemplo disso é 0 que se passa com os acordos de leniéncia, caso emblematico do impasse da competicdo institucional. Trata-se de um instrumento investigativo por cooperagao que, no Brasil, foi desenvolvido no sistema antitruste” Aproveitando-se dessa experiéncia no ambito do CADE, a Lei Anticorrupgio (Lei n® 12.846/2013) previu 0 acordo de leniéncia em seu art. 16, de seguinte redacao: Redagao original do art. 16 da Lei n? 12.846/2013: “Art. 16. A autoridade maxima de cada érgao ou entidade piblica poder celebrar acordo de leniéncia com as pessoas juridicas responsaveis pela pratica dos atos previstos nesta Lei que colaborarem efetivamente com as investigacoes e o processo administrativo, sendo que dessa colaboracao resulte: (..)”. Logo apés a edicao da Lei Anticorrupeao, uma disputa institucional entre Controladoria-Geral da Unio e Ministério Piblico Federal se instaurou em torno da titularidade do instrumento do acordo de leniéncia. Por um lado, a CGU com base no texto da Lei afirmava ser, por determinagio legal, titular da competéncia para celebra- 40 de acordo de leniéncia, Por outro lado, o MPF se insurgia contra esta interpretacao, reafirmando a sua posigao de lideranca nas investigaces de combate & corrupgao. Mais do que a titularidade da competéncia para celebragio de acordo de leniéncia, estava em jogo o poder institucional, ou seja, qual instituicao dispde de maior poder e, assim, colocar-se-ia a frente das demais nas atividades de investigagao. Diante dessa disputa, 0 acordo de leniéncia da Lei Anticorrupgao restava inutilizado, pois acordo celebrado no ambito da CGU nao interdita a atuagao do MP. Valendo-se da confissao da pessoa juridica no acordo de leniéncia, o MP pode ajuizar aco civil publica ou agao de improbidade administrativa em face do leniente. Do mesmo modo, poderia o MP firmar um acordo (por exemplo, no bojo de uma delacao premiada ou de um termo de ajustamento de conduta) e ao depois a CGU vir e declarar a empresa acoimada pelo parquet como inidénea, por exemplo. A atual conjuntura politica explica a edicdo da MP n® 703 em 18 de dezembro de 2015, que, dentre outras especificagées, reafirmou a titularidade do acordo de ® Cf. KERCHE, Fabio. O Ministério Paiblico na Constituigéo de 1988: uma nova instituigSo. In: DINIZ, Simone; PRACA, Sérgio (Orgs). Vinte anos de Consttuigao. Sio Paulo: Paulus, 2008. ® Cf.oart.86, daNova Lei do CADE (Lein®12.529/2011).O préprio ito doacordo de lenigncia na Lei Anticorrupgio segue o regime da Nova Lei do CADE, nos termos do art. 28, §28, da Lei n® 12.846/2013. mse mnacses Do contours soumsrmacioresucanoseast. | 35 leniéncia previsto na Lei Anticorrupgao na CGU. Esta éa nova redacao do art. 16 da Lei n? 12.846/2013 dada pela MP n® 703/2015:” Redagao do art. 16 da Lei n® 12,846/2013 dada pela MP n° 703/2015: “A Uniti, os Estados, o Distrito Federal eos Municipios poderdo, no ambito de suas competéncias, por meio de seus érgaos de controle interno, de forma isolada ou em conjunto com o Ministério Piiblico ou com a Advocacia Piiblica, celebrar acordo de leniéncia com as pessons juridicas responséveis pela prética dos atos e pelos fatos investigados e previstos nesta Lei que colaborem efetioamente com as investigacdes e com o proceso administrativo, de forma que dessa colaboragiio resulte:(..)”. (Destaquei) Para a presente andlise, importa verificar que foram previstos efeitos proces- suais quando da celebragao de acordo de leniéncia com a finalidade de disciplinar as competéncias investigativas compartilhadas pelas instituigdes de controle e, assim, revitalizar este instrumento. Em resumo, a titularidade do acordo de leniéncia pertence a0s 6rgaos de controle interno, que podem celebra-lo isoladamente com a pessoa juridica. Se a Advocacia Publica participar do acordo, impede-se que os celebrantes ajuizem ou prossigam com as acées previstas na Lei Anticorrupcao, agdes de improbidade administrativa ou acoes civis ptiblicas.* Caso 0 Ministério Puiblico participe da cele- bragao do acordo de leniéncia, os efeitos supracitados estendem-se também aos promotores e procuradores.* Uma vez assinado, 0 acordo de leniéncia é remetido ao Tribunal de Contas para, se o entender, instaurar processo administrativo contra a pessoa celebrante para apurar prejuizo ao erario,* de onde se depreende a competéncia de ressarcimento do erdrio publico delimitada pela Lei Anticorrupgao ao Tribunal de Contas. Quanto a responsabilizacao judicial, esta poderd ser afastada se expressamente prevista no acordo de leniéncia, e se todas as instituigdes controladoras ja relacionadas participarem.** Ainda como medida para viabilizar 0 acordo de leniéncia, previu-se a Participagao de drgaos e entes administrativos com competéncia sancionatéria no acordo de leniéncia,* como 0 CADE, a CVM e demais Agéncias Reguladoras. A MP n? 703/2015 claramente busca enderegar 0 problema da sobreposicio de insténcias de controle que enseja a competicao entre elas, conferindo maior racionalidade na equalizacéo das competéncias. A solucao proposta pelo Governo Federal é fragil, porém. O principal problema esta na espécie normativa Medida Proviséria, unilateralmente editada pela Presidente da Republica em um contexto de dentincias de corrupgao envolvendo membros de seu governo, seu partido politico e ela mesma. Trata- se de uma medida que diminui 0 poder de instituigdes de controle tradicionais — com A competéncia meramente residual do MP para celebrar acordo de leniéncia é reafirmada no §13 do art. 16 da Lei n? 12.846/2013: “Na auséncia de drgao de controle interno no Estado, no DF ou no Municipio, o acordo de leniéncia previsto no caput somente serd celebrado pelo chefe do respectivo Poder em conjunto com o Ministério Pablico”. © texto do art. 16, §11, da Lei n® 12.846/2013: “O acordo de leniéncia celebrado com a participaczo das respectivas Advocacias Piiblicas impede que os entes celebrantes ajuizem ou prossigam com as ages de que tratam 0 art. 19 desta Lei e o art. 17 da Lei n® 8.429, de 2 de junho de 1992, ou de ages de natureza civil” CE. art. 16, §12, da Lei n® 12.846/2013. CE. art. 16, §14, da Lei n® 12.846/2013. CE. art. 18 da Lei n’ 12.846/2013. CF. art. 29, §1%, da Lei n® 12.846/2013. ween MARCOS AUGUSTO PEREZ RODRIGO PAGANI DE SOUZA (COORDS) 36 | connote baapnnstnagio rOvica especial destaque para 0 Ministério Publico — e favorece a CGU, um controlador ainda em estagio inicial e cuja vinculacao direta ao governo é empiricamente comprovada. A estabilidade da solugao aventada apenas sera conseguida com a edico de uma lei formal (converséo da MP em Lei Ordinaria) e com um pronunciamento favoravel do Judiciério, notadamente do STF. Sem isso, a competi¢ao das instituigdes de controle em torno do acordo de leniéncia permaneceré. ‘A superacao desse impasse nao vird de uma soluc3o tinica. Talvez a principal mudanga seja a cultural, que apenas viré com o amadurecimento institucional dos controladores para cooperar, respeitar a esfera de administragao e alocar eficientemente © poder de controle. Impasse n° 7 — Decisdes instdveis: a estrutura do sistema de controle desfavorece decisdes definitivas A Administragao detém significativa parcela de poder decisério. A governabili- dade e a seguranca juridica dependem da tomada de decisao do Poder Publico, especialmente em assuntos regulatérios. Nao por outro motivo ha no Direito norte- americano a figura da petigao para inicio de processo regulamentar (rulemaking petition), em que os particulares demandam aos érgaos reguladores a elaboragao de normas para que tenham diretrizes mais claras na condugao de suas atividades. A atual estrutura do sistema de controle desfavorece decisées definitivas. Isso é especialmente verdade nas grandes decisdes puiblicas, como as normas de alto impacto regulat6rio, contratos de elevado valor econédmico e politicas publicas controversas. Salvo excepcionais excecdes, essas sao todas decisdes provisionais. Por um lado, decisbes mais sofisticadas tomadas pelo Poder Ptiblico requerem um controle mais incisivo, 0 que é salutar ao sistema. A critica se coloca quanto ao modo de controle, que torna 0 exercicio das competéncias ptiblicas apenas uma fase inicial da decisao final, a qual apenas advird apés a manifestacao do controlador. Novamente nos deparamos com 0 deslocamento de competéncia do Poder Piiblico para os controladores. Ocorre que o sistema normativo confere poderes de sobrestar os efeitos da decisao administrativa até chancela definitiva do controlador. O exemplo mais evidente corres- ponde as liminares judiciais, concedidas pela autoridade judicidria se presentes os requisitos de aparéncia do bom direito e perigo da demora. Sao os parametros da concessio de liminares efetivos conceitos juridicos indeterminados, ficando a decisio administrativa & mercé da orientacao subjetiva do magistrado. Nao raro decisdes administrativas complexas, que demandam pronta implementagao, sao imediatamente suspensas. E 0 que se verificou em novembro de 2014 com a sucessao de liminares no setor elétrico que deixaram ainda mais conturbado 0 cenario regulatério. Mais do que a judicializacao, um grande impasse no sistema de controle brasileiro est na auséncia de critérios mais objetivos para concessao de liminares. O problema se estende as instituicdes de controle que praticamente nao sofrem qualquer constrangimento para requerer liminares.** Outro exemplo que pode ser mencionado corresponde a andlise % Como jé assinalamos, o Judiciério nio age de offcio. Tits sdo os principais agentes que provocam a atuagdo jurisdicional sobre a Administracio: 0 proprio interessado, o autor popular eo Ministério Pablico. Com relacio a atuacio do Ministério Pablico na judicializacao da gestdo publica, reconhece-se oexercicio de discricionariedade pelo controlador também na eleigio das questées que serao levadas a apreciacao do Judiciério. “O problema que cosere mnasss bocontmone DaapuaneTeacaorosucanommast | 37 prévia de editais de licitagio pelo Tribunal de Contas, que adotou firme posicionamento no sentido de deter competéncia para suspender contratos administrativos, ainda que sem 0 crivo do Poder Legislativo. 1.3 Concluséo Garantias de governanga publica, com qualidade deciséria, e de seguranga juridica demandam uma profunda reforma do sistema de controle da Administragao Publica no Brasil. © Direito tem um papel central na definigao do realinhamento das instituicdes de controle. Contudo, é fundamental a mudanga cultural em torno do papel da burocracia publica no sistema juridico. Nem 0 Judiciério, nem 0 Ministério Publico detém o monopélio da hermenéutica legal. A Administracao Piiblica é hoje a principal intérprete do areabougo normativo e, se razoavel e bem fundamentada, © seu posicionamento merece deferéncia pelas instincias controladoras. A presungao de ilegalidade da atividade administrativa nao apenas impede o pleno exercicio das importantes fungées publicas atribuidas ao Poder Public, como também minam 0 desenvolvimento brasileiro. Impende analisar criticamente o papel das instituigGes para além do debate sobre a separacao de poderes e da inafastabilidade do Poder Judiciario. Nao hd um caminho certo. Talvez esta reforma do sistema de controle da Admi- nistragao Publica, que ao menos minimize os impasses indicados, leve geragées. Para nés, algumas frentes precisam se afirmar: 1. As competéncias institucionais precisam ser claramente definidas. Nao haverd governanca sustentavel com superinstituicdes pairando sobre as demais. 2. A corrupedo precisa ser exterminada. Hoje o principal gargalo ao desenvolvimento brasileiro é a corrupgao, seja pelo desvio de recursos publicos, seja pela contaminagao dos processos decisérios e a perda da legitimidade democratica. 3. E preciso ter uma maior reflexao sobre discurso de combate & corrupgao. Nem todas as falhas de gestao publica sao atos de corrupcdo. Erros honestos e diferentes interpretagdes merecem tutela juridica. Nao ha nada que predique que as interpretacdes ou prioridades identificadas pelos érgaos de controle sejam,em si, melhores que aquelas adotadas pelo administrador puiblico. Muito menos que divergir do controlador seja em si um gesto improbo. 4. A pesquisa sobre os limites, falhas e necessarios aperfeigoamentos do controle da Administragao Publica precisa ser disseminada pelas Faculdades de Direito e centros de pesquisa para, assim, os problemas concretos serem mapeados e receberem solucées juridicas. se coloca é que o Promotor de Justica também é um agente puiblico; ele exerce uma funcdo publica e, como tal, com as novas competéncias que foram atribuidas ao MP, passou a ter também uma grande discricionariedade para selecionar posigdes, demandas, causas, situagSes que vai eleger como aptas a provocar sua manifestacso € provocar 0 Judicidrio a exercer o controle da Administragdo no exercicio desta fungao”. MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Discricionariedade administrativa e controle judicial da administracio. Férum Admi- nistrativo, Belo Horizonte, v. 14, p. 4-44, 2002. 3B | ARCESAUCUTO Pte RONG PCAN DESOLEA (COORDS) (CONTROLE DA ADMINISTRAGAO PUBLICA Informagao bibliogrifca deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da AssociagSo Brasicira de Normas ‘Técnicas (ABNT): MARQUES NETO, Floriano de Azevedo; PALMA, Julians Bonacorsi de. Os sete impasses do controle dda administragio piblica no Brasil. In: PEREZ, Marcos Auguste; SOUZA, Radrigo Pagani de. Controle ‘da administragio public. Belo Horizonte: Forum, 2017. p. 21-38. SEN S7SSSS0OISSS.

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