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Resumos Literatura e Cinema (2.

ª parte)

1. Sophia de Mello Breyner Andresen e João César Monteiro: “um quarto em frente ao
mar” ou como filmar a poesia?
Filme questiona as condições de possibilidade da própria linguagem cinematográfica.
Demonstra que a poesia não é filmável e não adianta persegui-la.
“Muito mais do que um filme sobre a Sophia que, para mim, só de um modo aleatório é
parte dele, o meu filme é um filme sobre o cinema e a matéria nele.”

João César Santos, Sophia de Mello Breyner Andresen (1969)


O filme é uma reflexão sobre a obra, a arte, a poesia. Ao longo do filme, Sophia vai
declamando vários poemas, várias vezes interrompidos pela própria “vida”, numa lógica de
montagem que cria momentos de interrupção e não micro-narrativas.
Não havendo nenhuma estrutura real narrativa, o plano mais longo fixo é quando junto
de um dos filhos declama a Menina do Mar??, fá-lo de uma forma cativante, mas ao mesmo
tempo severa, intranquila, ao mesmo tempo que solene, mesmo contando uma história de
crianças a uma criança, parecendo pouco natural, artificial. No final desta cena, a criança diz
que a mãe “inventou a voz para o filme”. Sophia é exposta pela própria inocência do filho,
que demonstra que não se consegue, realmente, filmar a poesia. O plano acaba por se virar
“contra” si, uma vez que põe em causa a importância da leitura e de todo o dispositivo
cinematográfico.
Ao ler o seu discurso sobre a relação entre as coisas e a sua relação entre o real e a
ficção, vê-se o mercado de peixe e há quem interprete como uma contradição do discurso
desligado do que é narrado, enquanto se fala da presença das coisas, um estímulo que
incentiva a participação na criação da obra de arte). Contudo, vejo-o de outra forma: o
poema declamado acompanha as temáticas mais em detalhe que vão sendo introduzidas,
como quando reflecte sobre o factor de observar o “esplendor do mundo” nos levar sempre
à constatação do sofrimento, ao mesmo tempo que aparece uma imagem de vários peixes,
com seus olhos de mortos, na lota (ligação entre poesia e real).
No entanto, no restante filme parece haver um atrito contínuo, entre som, imagem,
relato. O cinema joga com contingências, com aquilo que não está planeado (momento de
reflexão, num impasse de interrogação). Há uma impossibilidade cinematográfica de se
pensar poeticamente.
A curta parece também ter um ciclo, na medida em que várias ideias introduzidas no
início são retomadas, e de certa forma contrariadas, no fim. Quando declama o poema do
mar ao filho, fala da menina que tinha saudades, e finaliza dizendo que ela própria não é
nada saudosista.
O próprio final, a cena da assinatura que é seguida por um plano branco, pode evcoar
essa ideia de ciclo, de fim, o eterno retorno ao branco do mar.

João César Monteiro, “Auto-entrevista”


Faz cinema pela sua vontade, sem se “amouchar ao sabor dos desígnios (...) do fascismo
(...)”
Resumos Literatura e Cinema (2.ª parte)

“A poesia não é filmável e não adiante persegui-la. O que é filmável é sempre outra coisa
que pode ou não ter uma qualidade poética. O meu filme é a constatação dessa
impossibilidade, e essa intransigente vergonha torna-o, segundo creio, poético, malgré-lui.
Creio também, e acho espantoso que a crítica não tenha dado por isso (o que alias, só
reforça uma impressão velha sobre a infinita ignorância dita), que muito mais do que um
filme sobre a Sophia que, para mim, só de um modo aleatório é parte dele, o meu filme é
um filme sobre o cinema e a matéria nele” – filme é resultado de uma reflexão sobre o
cinema: o “cinema não é mais que um itinerário que instaura o reencontro do homem
consigo mesmo”
Cena da criança criticar a mãe é aleatória
“o seu filme é resultado de uma dada reflexão

João César Monteiro, Veredas (1977), lendas e mitos populares portugueses


- Leitura das lendas e mitos populares
- Curtas fazem ressoar o universo quimérico que anima a longa
- Mas como continuar a contar depois de acabada a história, como acreditar no amor depois
de despojados os amorosos?

João César Monteiro, Veredas (1977)


Perguntar é caminhar
- Há sempre um caminho a percorrer nos filmes
- Travessia (das personagens) parece sem sentido - exp: nevoeiro e transformação
do par como fantasmagórico, de dissolução na sombra - também o nevoeiro pode por em
perigo essa ligação
○ Deambulam e as próprias duas imagens tornam-se numa figura de
repetição – ideia de deambulação geográfica, mas tbm demitologias
- Transformação de JSM, como personagem dos seus filmes

Plano de Atenas
- Atenas precisava de descer para falar com camponesas alentejana (campo contra
campo, plano vertical e baixo e cima)
- Silhuetas fanstamáticas das camponesas no horizonte - possibilidade de
intercambio ocorreu, transformação deu-se
○ Transformação do próprio pensamento grego; transformação da sociedade
ateniense (evolução num sentido monoteísta) - Atenas encarna a vontade de progresso

Não se segue a ordem da intriga - leva-nos a pensar uma ideia de narrativa por acumulação -
Mãe e filho vêm substituir o par inicial

Perde-se o horizonte - metamorfose imediata


Resumos Literatura e Cinema (2.ª parte)

Com uma forte componente imaginativa e uma notável vertente documental, o filme é uma
reflexão sobre as nossas raízes culturais, passando por séculos de um país com uma longa
história.
Tras os montes, mirandês - vestígios mais antigos de um tempo arcaico  Esta região e as
suas tradições folclóricas despertaram igualmente o interesse das(os) cineastas
Caretos são o. diabo
Nesse sentido, o modo como João César Monteiro inicia o filme é já revelador de uma
intenção de demarcar o espaço em que se concentra a narrativa de Veredas. Um espaço
que, no entendimento do autor, não deve ser manipulado, nem profanado, um espaço que
se pretende sagrado – extensa paisagem  Numa entrevista concedida a Rodrigues da
Silva, publicada no Jornal de Letras em 1992, César Monteiro revela que a lógica inerente
nos seus filmes é passar da abominação ao sagrado

Filme produto do 25 de A e da democraticidade do cinema: fim da vala entre intelectuais e


da ruralidade; por isso homenageia-a num retrato. As transformações políticas permitem
uma produção culturar acessível a essa camada da população, não só pela introdução no
estilo documentado de pessoas reais, mas antrás da introdução de histórias e milogiais
populares-rurais.

Admito eu própria algumas dificuldades de compreenao do filme, mas, como já dizia César
Monetiro, “o povo não é simples ou fácil” e “só um insensato pode ter a pretensão de
perceber tudo”.
O que liga os váriso blocos do filme?
Valsa de Diabelli é obsessão do par. – o filme é construído sobre uma série de variações
desta obsessão
É um filme sobre amor e um itinerário
Travessia do Alentejo é continuação da historia da bela-flor: lugar de separação do par, mas
há sequencias da travessia do rio da morte, do esquecimento (pode noa haver perda, mas
há transofmrçaão de relação amorsosa, mae-filhp)
Atena encarna desejo de progresso (monoteísmo)

“Enganam-se aqueles que pensam que a alma do povo é simples ou fácil”

João César Monteiro, Os dois soldados (-)


João César Monteiro, O Amor das Três Romãs (-)
João César Monteiro, A Mãe (-)
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João Botelho
Faz parte de uma geração de cineastas, junto com JCM, Pedro Costa, João Mário Grilo,
entre outro, que fazem “cinema anti-espetáculo”, formalista e ascético. Quando numa
entrevista em 1996, o questionam acerca de quais as características comuns aos cineastas
portugueses, Botelho responde: “A presença da literatura e sobretudo da poesia nos
filmes, a escolha de enquadramentos secos, com uma composição muito cuidada, uma
montagem descarnada. E a falta de dinheiro, que nos leva a fazer coisas estranhas...”.
A questão da adaptação das obras literárias (e das várias artes, como bem presentes
neste filme, como a música e a ópera) ao cinema volta a entrar em palco na nossa reflexão.
A ideia de cinema (im)puro de Bazin que conjuga elementos de cooperação e “mistura”,
onde vários elementos diferentes se conjugam construindo a melhor experiência possível.
João Botelho é da geração que chega ao cinema depois do 25 de Abril e, neste caso, por
causa do 25 de Abril. A questão da democratização do cinema é muito presente nesta
geração de autores e as suas preocupações sociais reflectem-se nas suas obras: desde a
importância da demonstração da cultura rural e folclórica portuguesa em César Monteiro,
numa componente de classe que é honrada, demonstrada e respeita, a uma questão racial,
como Pedro Costa introduz, do outro lado que não é mostrado.

Duas ideias gerais do filme: (1) autonomia do som dos textos que, quando lidos em voz
alta, se elevam (assim como o cinema), a escrita (a arte) é maior que o seu ator). (2) noção
do tempo cinematográfico

Um filme inquietante, onde os objectos adquirem papéis especiais, desde os sapatos das
mulheres que dançam aos dardos da cena inicial, ou ao tecto dos próprios espaços que
frequentam as personagens, ou a mosca do escritório. O desassossego é expresso na noção
de tempo cinematográfico, “pois é apenas no tempo que a existência indeterminada pode
ser determinável”, perdido na ideia na falta de enredo (“ficção sem ficção”), num filme que
reproduz o sofrimento, a vivência. Quem fala aqui é o poeta e a sua obra, numa dialéctica
constante entre palavras e imagens, provocada pela autonomia dos sons dos textos. Textos
que, quando lidos em voz alta se elevam (assim como o cinema). Como se lia algures, o
mérito do filme é a própria “ordenação” do delírio, numa construção de imagens e
transposição, da importância dos sons e do contraste luz/sombra, na vida, no cinema e na
literatura. “Texto e cinema operam pelo grande plano como um dispositivo de ampliação do
real pela sensibilidade”, é o sensacionismo.
A ordenação do delírio e a noção de tempo cinematográfico são questões curiosas neste
filme. O livro do desassossego tem várias versões, diferentemente ordenadas, pois constitui
um conjunto de textos, de “fragmentos”, pelo que a sua ordenação vai variando. O próprio
filme, não seguindo uma lógica de continuidade, procura levar algum tipo de seguimento
nesta loucura de inspirações e divagações de bernardo Soares.
Resumos Literatura e Cinema (2.ª parte)

João Botelho filma o “infilmável”, pois sabe que o Livro do Desassossego “só existe em
voz alta”, quando o sonho é exteriorizado, numa ideia de literatura alterada, pois filma a
confusão, a não-história. Tenta captar aquela que é a essência da obra, a ligação da
imagem-palavra-som. Como diz Fernando Pessoa numa das cenas iniciais, “a arte de quem
escreve para Orfeu só serve para poucos” – assim como a arte (o cinema, aqui) só serve
para poucos (para os loucos).
O papel da arte, não como vimos em filmes anteriores onde se coloca a questão de para
quem, até como, vem de maneira diferente: para quê? O indivíduo e a sociedade, em
contraposição são uma marca: nos elementos de classe introduzidos, no deslocamento e
comportamentos estranhos de Bernardo Soares e na sua contemplação (e reflexão) do
espetáculo que o rodeia. Procura-se a conexão humana: e é bem palpável a intimidade e
aproximação que se materializa na troca da arte, visível quando BS oferece a FP o manifesto
da sua obra, como uma extensão da fragmentação do EU destes.
Apesar de considerá-lo indiferente ao sofrimento alheio (a não ser para aprofundar a sua
escrita), pelo filme há vários elementos introduzidos de diferenças sociais: quem serve e é
servido – até na fila da sopa dos pobres, quando há uma espécie de semi-diálogo, onde há
uma contradição entre as “dores de cabeça” de Bernardo Soares, homem sofrido por
condição coincidente de existência, e os que se encontram na fila, pela condição material de
classe.
A iluminação do filme é outro importante elemento, na batalha constante entre luz e
sombra demonstra também o conflito interno que surge destas reflexões. BS tem medo do
escuro, da trovoada, da confrontação com o sofrimento; mas despreza a luz, o contacto com
a realidade e a observação do espetáculo em seu redor.

Oscilação, no LD, entre a “literatura da cara e da figura, da superfície” e a “literatura da


profundidade e dos orifícios”. No primeiro, é a constatação com o real, são “superfícies de
reflexo e meditação” e no segundo é a acessão ao mais profundo, à linguagem, à fala, ao
pensamento. O espelho representa a junção dos dois processos. Também a cena da
“Educação Sentimental” apresenta uma fusão destas duas linhas: no monólogo de
Wallestein, o ar vai fugindo e o plano vai-se afunilando, aumentando a tensão até chegar ao
climax. Primeiro, temos o contacto com a cara da superfície, o plano amplo, com todos os
objectos que também eles têm vida. Depois, vai estreitando a imagme, até começarmos a
chegar às “bocas-vozes” até focar apenas nos lábio vermelhos, de onde sai a sua voz, as suas
palabras: o LD so faz sentido em voz alta.

Bastou para o Filme do Desassossego ter sobre si o pendor da adaptação, neste caso, o
título, para ter sobre si uma hipoteca identitária. O cinema é o plano em que a literatura se
pode pensar e ver na sua relação com todas as outras coisas e todas as outras artes, a
começar pela própria literatura, e este filme é a prova disso. A adaptação não tira a pureza
do cinema, pois não procura “muletas” na literatura, pelo menos não este cinema. A riqueza
vem deste processo e neste caso da unidade entre literatura e cinema, entre as obras e todo
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o seu potencial. O cinema, como arte imortal, nunca perderá o seu lugar no pódio dos
deuses, pois, a meu ver, ele traz-nos algo que nem todas as artes consegues: a capacidade
de não só nos inquietar, mas ajudar-nos a fugir da vida, ao mesmo tempo que às vezes
queremos fugir deste.

Cena da taberna
“plano-sequência”, de seguimento de acções que culmina com a cena da briga, constitui
a expansão (para diante e para os lados e dentro) e a densificação que define a “textura”
desse tempo,
Travelling (cena dos dardos, FP a BS) une o espaço (Bazin), densificando-o como corpo
Aumentar das emoções quando o homem começa a cantar na taberna, acção que
provoca algum desassossego nos outros (do seu lado da barreira social). O escalar da
situação, de certa forma até assemelhável a um contexto de luta de classes, culmina numa
pseudo-tragédia – como espectadores do mundo Bernardo Soares e Fernando Pessoa
apenas observam.
A partir daqui (acho) FP e BS (des)fragmentam-se e separam-se e Bernardo Soares
vagueia na sua autonomia, sempre à escuta das conversas de estranhos, a observar os
detalhes das interacções que o rodeia

Cena espelho
Bernardo Soares, quando no espelho admite que “entre mim e a vida há um vidro ténue,
por mais nitidamente que seja a vida não lhe posso tocar”. Voltamos novamente à questão
das barreiras intransponíveis d’Os Verdes Anos.
“No Livro do Desassossego, as máscaras, os espelhos, as faces do rio são superfícies de
reflexo e meditação quando a proximidade extrema do objecto do nosso olhar, a
indeterminação dos “sonhos vagos” ou a luz demasiado forte dissolve os contornos e liberta
um “rosto à deriva”, um rosto-paisagem”
“O criador do espelho envenenou a alma humana.” (L.D.)

Conversa Acabada “trata-se de um diálogo (a conversa do título) entre dois amigos


distantes, que só se cruzam uma vez na tela, sobre o fundo estilizado do Terreiro do Paço”.
não há afloramento, há rigor. A ideia não era escrever uma história aristotélica(?), aliás, a
ideia inicial era um ecrã preto, em voz off, onde se liam os textos dos dois amigos; mas as
loucuras de artistas não podem dar-se ao luxo de qualquer forma de ter variados
espectadores a saírem de uma sala de cinema por não terem o elemento visual, como
admite Botelho. Por isso, os detalhes cronológicos e da vida são apenas algo que dê
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estrutura ao diálogo, mas sem haver história, apenas uma falsidade desta. “O livro detém
uma qualidade fragmentária com que se esquiva ao conforto da narrativa sequencial e
tematicamente focada: não tem princípio nem fim”, assim como o filme.
O filme é feito sobre a palavra (literatura e cinema), pelo que não quer imagens em
movimento que possam “distrair” o espectador.
“Vinte e oito anos depois, ao voltar a Fernando Pessoa em Filme do Desassossego,
Botelho agiria de maneira totalmente diversa e multiplicaria os cenários, transformando, de
maneira elaborada, reconhecíveis cenários naturais em Lisboa em espaços puramente
cinematográficos, por vezes espetaculares.”
A imagem do Filme é uma imagem-massa=volume=fluxo (abstracta), diferente de
Conversa Inacabada onde imagem-puzzle.
“não temos aqui a lógica: estética (modernista) da “transparência” de conversa aberta,
mas sim uma concepção de “forma” barroca e como massa

Marcha com um elemento quase idílico de fuga no filme (através do sonho)

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