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FíSTULAS DIGESTIVAS

FISTULAS DIGESTIVAS

Fístula digestiva é definida como sendo uma comunicação anormal
entre dois órgãos internos ou entre um órgão interno e a superfície
corporal, na maioria das vezes unindo duas superfícies epiteliais.

As fístulas podem ser ainda classificadas em congênitas ou adquiridas,


internas ou externas, únicas ou múltiplas, espontâneas, traumáticas ou
pós-operatórias.
Em um serviço de cirurgia geral ou cirurgia digestiva, de 75% a 85% das
fístulas são pós-operatórias. Elas são relativamente frequentes, pois ocorrem
em 3,5% a 37% das cirurgias abdominais eletivas, sendo mais frequentes
após cirurgias oncológicas, lise de aderências e em pacientes portadores de
doença inflamatória intestinal.
A ocorrência de uma fístula digestiva após cirurugia abdominal ou trauma
está associada a aumento acentuado do tempo de internação, necessidade
de uma ou mais re-operações, aumento do sofrimento do paciente e do risco
de complicações e óbito e importante aumento dos custos

Enquanto a mortalidade para a maioria dos procedimentos cirúrgicos eletivos


hoje encontra-se abaixo de 2%, em pacientes com fístula digestiva a
mortalidade varia de 6,25% a 48%. O manejo adequado de uma fístula
digestiva depende de abordagem multidisciplinar seguindo plano de
tratamento organizado.
O grupo multidisciplinar deve incluir o cirurgião, radiologista, endoscopista,
além de enfermeira especializada no manejo de estomas, fisioterapeuta,
psicólogo e equipe com experiência em suporte nutricional. O plano
terapêutico organizado inclui a definição de prioridades seguindo uma ordem
cronológica adequada e adaptada às condições do paciente.

A mortalidade do paciente com fístula digestiva varia de 6,25 à 48%.

O reconhecimento precoce de uma fístula digestiva é essencial para que se


possa dar início imediatamente ao tratamento e assegurar melhores
condições para o fechamento espontâneo. Entretanto, existe tendência
natural do cirurgião em evitar reconhecer a sua complicação cirúrgica,
retardando com isto o diagnóstico e o tratamento, o que frequentemente leva
a quadros graves de sepse, desnutrição e óbito.
Por outro lado, a conduta oposta, com intervenção cirúrgica precoce e
intempestiva pode resultar em nova fístula e em agravamento das condições
gerais do paciente, com aparecimento de distúrbios hidro e eletrolíticos,
lesões de pele pelo contato das secreções digestivas e o acúmulo de
secreções intra-abdominais, com desencadeamento de sepse grave.

Em ambos os casos, o resultado é a deteriorização progressiva do estado


geral e nutricional do paciente.
Portanto, qualquer modificação na evolução pós-operatória em um paciente
portador de anastomose digestiva, ou de modificação na quantidade e
aspecto das drenagens abdominais deve levantar a suspeita que uma fístula
digestiva possa estar ocorrendo. Nas fístulas digestivas altas a administração
de azul de metileno por via oral permite a confirmação da existência de fístula
à beira de leito. Confirmado o diagnóstico, a abordagem terapêutica deve
seguir um plano cuidadoso, que inclui controle da infecção, terapia nutricional
adequada e indicação cirúrgica precisa. É evidente que estes procedimentos
são dinâmicos e frequentemente simultâneos. Entretanto, para efeitos
didáticos, os mesmos serão abordados de maneira sequencial.

O reconhecimento precoce da fístula é ponto essencial do seu tratamento.

AVALIAÇÃO CLÍNICA E NUTRICIONAL INICIAL

Após o reconhecimento da existência de uma fístula do trato digestivo devem-


se iniciar medidas que visem a estabilização do paciente: correção de
distúrbios hidroeletrolíticos e acidobásicos, identificar e tratar
processos infecciosos associados, reduzir e/ou controlar o débito da
fístula, proteger a pele e planejar e instituir o suporte nutricional. O
cumprimento dessas metas deve ser simultâneo, rápido e eficiente.
Visando atingir esses objetivos a avaliação clínica e nutricional deve ser
criteriosa e completa.

A história clínica detalhada será fundamental nos pacientes encaminhados de


outros serviços. Frequentemente tais pacientes chegam ao hospital de
referência sem descrição detalhada do(s) procedimento(s) cirúrgico(s)
prévio(s). Nesses casos é importante contactar-se o médico que o assistiu,
conhecer a doença de base, operações prévias, medicações utilizadas, em
particular antibióticos, e exames complementares já realizados. Além da
avaliação clínica e do exame físico detalhado, é essencial realizar uma
avaliação nutricional detalhada. A avaliação nutricional deverá ser repetida
semanalmente para que se possa determinar as necessidades nutricionais do
paciente e a resposta à terapia nutricional.

CORREÇÃO DOS DISTÚRBIOS HIDROELETROLÍTICOS

Frequentemente, a drenagem de uma fístula digestiva alta ultrapassa os 500


ml/24 horas, e pode chegar a 2-3 litros por dia. No passado, estas perdas
hidro-eletrolíticas eram causa frequente de mortalidade. Atualmente, com os
progressos alcançados no manejo de pacientes graves com relação ao
equilíbrio hidro-eletrolítico e ácido-básico, mediante mensuração e dosagens
cuidadosas dos eletrólitos nos líquidos de drenagens das fístulas, houve
redução da mortalidade. Entretanto, estudos mais recentes não relatam
nenhuma mortalidade relacionada a distúrbios hidro-eletrolíticos. A
monitorização hidro-eletrolítica e ácido-básica tanto plasmática como dos
líquidos de drenagem é fundamental para que se possa evitar complicações,
especialmente nas primeiras 48 horas, período no qual o paciente encontra-
se mais instável.

CONTROLE DA FÍSTULA

O controle da fístula é um passo importante nestes pacientes porque as


secreções digestivas são ricas em enzimas e bactérias, as quais podem
causar abscessos intra-abdominais e lesões de pele. O exame digital ou
instrumental cuidadoso do trajeto da fístula à beira de leito muitas vezes é
suficiente para assegurar drenagem adequada da fístula, evitando a formação
de abscessos intra-abdominais. Abscessos adjacentes à fístula devem ser
drenados imediatamente, para evitar coleções. Em fístulas crônicas deve-se
evitar a tendência natural da pele de cicatrizar antes do fechamento do lado
visceral da fístula, o que favorece a formação de coleções intra-abdominais.

Deve-se assegurar drenagem adequada da fístula, para evitar a formação de


abscessos intra-abdominais.

PROTEÇÃO DA PELE

Aspiração contínua é muito útil nos primeiros dias para assegurar drenagem
adequada e proteção da pele até que se forme um trajeto fibroso. Quando o
trajeto está formado, em geral após o 7º dia de fístula, o dreno de aspiração
pode ser substituído por tubos de aspiração progressivamente menos
calibrosos até retirá-los completamente, pois a permanência do tubo impede a
cicatrização por funcionar como corpo estranho. Quando a pele em torno do
orifício de saída da fístula está seca e íntegra pode-se adaptar bolsa de
colostomia, a qual evita o contacto direto entre o conteúdo da fístula e a pele.
Em alguns pacientes, especialmente aqueles transferidos de locais com
menos experiência no manejo destes pacientes, a pele já se encontra
bastante macerada, torando impossível a colocação de bolsas de colostomia.
Nestas condições a aspiração contínua é bastante efetiva em promover
cicatrização da pele em torno da fístula. A pasta de Karaya é efetiva em
protejer a pele.
Uma situação especial é aquela na qual a fístula drena pela incisão cirúrgica.
A proteção da pele é bastante difícil nestas condições pela dificuldade em
aplicar-se bolsas coletoras, e frequentemente ocorre infecção da ferida,
deiscência e evisceração.

CONTROLE DO DÉBITO DA FÍSTULA

Sabe-se que a morbi-mortalidade está associada ao débito da fistula e,


consequentemente, estratégias para reduzir tanto o volume quanto o
conteúdo das secreções, poderiam melhorar o estado nutricional e
hidroeletrolítico; reduzir o tempo de cicatrização; melhorar a cicatrização da
ferida; reduzir as perdas de nutrientes e de enzimas e, consequentemente,
melhorar o prognóstico. Com isso, ocorre a redução no tempo para
fechamento da fistula, reduzindo também o tempo de hospitalização e os
custos do tratamento. Em pacientes que vão necessitar de cirurgia, a redução
do débito permite melhorar as condições locais. Há ainda melhora
significativa na qualidade de vida do paciente. Por isso, o débito das fístulas
em 24 horas deve ser cuidadosamente monitorizado.
No entanto, não existe na literatura consenso quanto à definição de fístulas
de alto e baixo débito, os valores mais utilizados são os que consideram 500
ml/24 horas como limite.
As fístulas de alto débito, ou seja, com débito maior que 500 ml nas 24h
apresentam mortalidade três vezes maiores quando comparadas as debaixo
débito.

A redução do débito da fistula é um dos objetivos do tratamento e também


tem muitas vantagens, entre elas:
Papel da Somatostatina/Octreotide - A somatostatina e o seu análogo
sintético octreotide inibem a secreção gastrointestinal, inibindo a secreção
pancreática exócrina e endócrina e o fluxo sangüíneo pancreático. Além do
mais, têm outros efeitos reguladores tais como: reduzir a motilidade, a
secreção e o esvaziamento gástrico, o esvaziamento da vesícula biliar, a
motilidade intestinal e a secreção de vários hormônios, entre eles, a
colecistoquinina, a secretina e o peptídio vasoativo intestinal.

A despeito das vantagens do uso da somatostatina, esta possui alguns


inconvenientes, pois sua vida média é muito curta, necessitando infusão
contínua. Além disso, ela pode piorar o controle da glicemia e possui um
efeito rebote com a sua retirada que pode resultar em novo aumento do
débito da fístula. Estudos mais recentes têm relatado o uso de um análogo
sintético da somatostatina, o octreotide. As vantagens do octreotide sobre a
somatostatina incluem a sua vida-média mais longa e possibilidade de uso
subcutâneo, duas a três vezes ao dia.
Possui acentuada ação inibitória sobre as secreções digestivas em geral, e
gastro-pancreáticas em particular. Poucos efeitos colaterais têm sido
relatados, em geral diarréia e dor abdominal leves. A redução do débito da
fístula com o uso do octreotide reduz as perdas hidro-eletrolíticas e de
nutrientes, além de permitir melhores cuidados locais por reduzir a ação
corrosiva das secreções digestivas na pele. Apesar do seu uso aumentar a
velocidade de fechamento da fístula, não esatá determinado se aumenta a
percentagem total de fechamento espontâneo das fístulas digestivas.

A redução do débito da fístula com octreotide reduz perdas hidroeletrolíticas e


de nutrientes, além de permitir melhores cuidados locais.

Também foi observada redução do débito de fístulas digestivas com o uso


de dietas enterais oligoméricas. A drenagem diminui em pacientes com
fístulas pancreáticas ou intestinais distais (após 130 cm do ângulo de Treitz).
Fístulas proximais apresentaram aumento do débito com a introdução de
dietas enterais.

ESTUDO ANATÔMICO

A determinação precisa da localização da fístula é aspecto importante para


orientar o tratamento e determinar o prognóstico. A dosagem da amilase ou
das bilirrubinas pode ocasionalmente indicar a origem da fístula, mas são os
estudos radiológicos e endoscópicos que vão determinar a localização
precisa da origem da fístula.

A localização anatômica da fístula é aspecto fundamental para orientar o


tratamento e determinar o prognóstico.

Os estudos radiológicos devem ser realizados assim que o paciente tenha


condição geral estável e que possa suportar uma sessão de estudos
radiológicos. Em geral o estudo é feito após o 5º - 7º dia do início da fístula.
O material de contraste deve ser iodado (Gastrografina ou Hipaque), o qual é
injetado diretamente no orifício fistuloso. Todos os orifícios identificados
devem ser explorados. O cirurgião deve estar presente juntamente com o
radiologista no momento do exame, para interpretação mais adequada deste.

Os objetivos dos estudos radiológicos são os seguintes: 1. identificar o local


da fístula; 2. avaliar se há continuidade do intestino; 3. avaliar se há obstrução
distal; 4. avaliar o estado do intestino adjacente à fístula, para afastar a a
possibilidade de doença remanescente; 5. afastar a possibilidade de
abscesso ou outras coleções adjacentes à fístula ou mesmo à distância.

Seriografia digestiva alta, trânsito intestinal ou enema baritado podem auxiliar


em delinear com mais detalhes o trato gastrintestinal e o trajeto fistuloso. A
endoscopia digestiva a lta, a colonoscopia e a cistoscopia também podem ser
úteis.

Com base nestes achados será possível avaliar se a fístula tem tendência a
fechamento espontâneo ou não.

A presença de abscesso intra-abdominal, corpo estranho, fístula de trajeto


curto, falta de continuidade intestinal, obstrução intestinal distal à fístula,
fístula exteriorizando-se em uma evisceração ou doença residual (câncer,
doença inflamatória intestinal, enterite actínica) são todas condições que, se
presentes, vão atrapalhar o fechamento espontâneo. Nestas condições é
provável que a cirurgia seja necessária para a correção da fístula.

Exemplos de localização das fístulas digestivas - As fístulas esofágicas


cervicais pós-esofagectomia são a complicação pós-operatória mais comum
após esofagectomia com substituição com o estômago ou cólon ou após
esofagorrafia por trauma, com uma incidência que varia de 1,7 a 41%, com
uma média de 15%.
As fístulas gástricas são na maioria das vezes complicações pós-operatórias
de cirurgias gástricas, ou ocorrem após ulcerorrafia por úlcera gástrica
perfurada. O melhor tratamento para as fístulas gástricas é a ressecção do
trajeto fístuloso, com gastrorrafia.
Fístulas duodenais podem resultar de trauma abdominal aberto ou fechado ou
como complicação pós-operatória de cirurgias gastroduodenais. Podem
também ser consequentes a lesão intra-operatória sobre o duodeno durante
operações sobre outros órgãos, como nefrectomia ou colectomia direita e
apendicectomia em apêndice retro-cecal. Dentre as operações gastro-
duodenais, as fístulas duodenais pode m ocorrer após piloroplastia,
gastrectomia, colédoco-duodenostomia, papilotomia trans-duodenal,
procedimentos sobre o pâncreas ou após o fechamento de úlcera duodenal
perfurada. O prognóstico das fístulas duodenais é reservado.
Fístulas colônicas levando a peritonite fecal ocorrem em cerca de 5% das
anastomose de cólon. Entretanto, a incidência de estravazamentos menores
pelas anastomoses colônicas é provavelmente maior. Fístulas colônicas
espontâneas são relativamente frequentes, em geral associadas a doença
diverticular, câncer e doenças inflamatórias intestinais. A diverticulite pode
resultar em fístula colovesical, colovaginal, coloureteral e colo-ileal. A
drenagem de um abscesso paradiverticular com frequência acompanha-se de
fístula fecal.
Fístulas pancreáticas podem ocorrer após pancreatite aguda, operações
sobre o pâncreas por pancreatite crônica ou tumor ou são secundárias a
trauma abdominal fechado ou aberto, e em geral acompanham-se de
acentuada morbi-mortalidade relacionada a complicações infecciosas ou
metabólicas. Fístula pancreática pode resultar também de pseudocisto de
pâncreas ou do seu tratamento, como nas drenagens internas para o
estômago, duodeno ou jejuno. Em geral 50% das fístulas pancreáticas
internas e 70% a 90% das fístulas pancreáticas externas podem fechar sem a
necessidade de cirurgia.
Fístulas biliares ocorrem mais frequentemente após operações sobre a
vesícula ou as vias biliares por afecções benignas ou malignas. Pode ocorrer
lesão da via biliar durante operações sobre a vesícula biliar, especialmente
frente a processos inflamatórios severos ou quando existem anomalias da via
biliar extra-hepática. Fístula biliar é complicação rara de traumatismos
abertos ou fechados da via biliar. Pode ocorrer fístula biliar interna para o tubo
digestivo, em geral para o duodeno ou cólon. O tratamento das fístulas
biliares normalmente é expectante, porque a tendência natural destas fístulas
é fecharem espontaneamente. Entretanto, se evoluírem para estenose biliar o
tratamento é cirúrgico.

CONTROLE DA INFECÇÃO

Os avanços obtidos no monitoramento do paciente com fístula digestiva, a


correção dos desequilíbrios hidro e eletrolíticos e a correção da desnutrição
com a nutrição parenteral diminuiram em muito a mortalidade das fístulas
digestivas. A principal causa de óbito destes paciente atualmente é a sepse
descontrolada.

O tratamento da sepse de um paciente com fístula digestiva inclue a


drenagem de coleções e o uso adequado de antibióticos.

Antibióticos - O tratamento da sepse relacionada à fístula digestiva em geral


inclui a drenagem de coleções abdominais e o uso apropriado de antibióticos.
Apesar de serem frequentemente utilizados nestes pacientes, as suas
indicações não estão claramente definidas na literatura. Atualmente indicam-
se antibióticos no momento do diagnóstico da fístula até que a mesma esteja
controlada e adequadamente drenada. Na presença de abscesso associado,
os antibióticos estão indicados juntamente com a drenagem cirúrgica. Outras
indicações incluem septicemia, colangite e o preparo dos pacientes para
cirurgia.
Um problema frequente nos pacientes com fístulas digestivas e que estão
recebendo nutrição parenteral é a febre na ausência de foco definido, pois
nestas condições o diagnóstico de infecção do catéter da nutrição parenteral
se impõe, porém sua confirmação nem sempre é fácil. Antes do catéter ser
incriminado como responsável pela febre é importante descartar-se febre de
origem respiratória ou urinária ou ainda decorrente de coleções intra-
abdominais. Métodos que incluem culturas semi-quantitativas de sangue
obtido através do catéter e de veia periférica simultaneamente podem ser
efetivos no diagnóstico da infecção com o catéter in situ.

Diagnóstico e tratamento da sepse intra-abdominal - Apesar do


desenvolvimento dos métodos diagnósticos, a confirmação da presença de
coleções purulentas nos pacientes com fístulas digestivas ainda depende
muito da habilidade e experiência do cirurgião. A avaliação de um paciente F
deve se iniciar pela exploração da ferida cirúrgica e do orifício fistuloso. A
exploração do trajeto pode ser feita digital ou instrumentalmente. Esta
exploração pode revelar a presença de coleções junto ao trajeto fistuloso ou a
presença de celulite ou de infeção de parede, as quais podem ser
adequadamente drenadas, mesmo à beira do leito. Muitas vezes a drenagem
de um grande abscesso de parede pode revelar a presença de uma fístula
responsável pela infecção. O exame digital deve incluir os estomas, se
presentes, além de exame retal e vaginal para se detectar coleções
purulentas.
A falha em se drenar de maneira adequada um abscesso nestes pacientes
associa-se à mortalidade extremamente elevada, pois frequentemente esses
pacientes apresentam comprometimento dos mecanismos imunológicas de
defesa, contribuindo para a alta mortalidade.

TERAPIA NUTRICIONAL

Desordens nutricionais estão presentes em 55 - 90% dos pacientes


portadores de fistulas enterocutâneas. Portanto o reconhecimento e
tratamento ideal destas alterações são de importância capital para o manejo
adequado da fistula digestiva e redução dos índices de morbidade e
mortalidade. Os índices de mortalidade têm se reduzido nas últimas décadas,
de 40% a 65% nos anos oitenta para 10-15% nos últimos relatos da literatura.
Isto devido aos avanços do tratamento intensivo, da terapia nutricional, da
antibioticoterapia, dos cuidados com as feridas e das técnicas operatórias. As
causas primárias de morte por fistulas gastrointestinais foram e continuam
sendo a desnutrição, os distúrbios hidroeletrolíticos e a sepse. Nas fístulas de
alto débito, a mortalidade permanece em torno de 35%. Estudos
demonstraram que a terapia nutricional adequada reduz o tempo de
fechamento e consequentemente, a morbi-mortalidade das fístulas digestivas.
Porisso, a avaliação nutricional mencionada anteriormente é fundamental
para que se possa determinar a presença e a intensidade da desnutrição. A
perda de proteínas, a redução da ingestão de alimentos e o hipercatabolismo,
geralmente associado à sepse contribuem para este quadro. A desnutrição
causa hipoproteinemia, aumentando o risco de deiscência de feridas e o
desenvolvimento de infecções. Nestas situações a atividade dos fibroblastos
está reduzida e leva a falha da contração da ferida, resultando em maior
demora no tempo de cicatrização.

O papel da terapia nutricional no manejo das fístulas digestivas é suportivo.

O papel da terapia nutricional, tanto parenteral como enteral, no manejo das


fístulas digestivas, é basicamente suportivo. A nutrição tem por objetivo
prevenir maior deteriorização do estado nutricional, prevenindo assim a piora
da desnutrição. Além disso, tem sido sugerido que a terapia nutricional é
capaz de reduzir ou modificar as secreções digestivas, o que é considerado
por alguns como papel terapêutico primário. A terapia nutricional deve ser
iniciada precocemente para prevenir perdas acentuadas e para repor as
perdas já exixtentes.

Desordens nutricionais estão presentes em 55-90% dos pacientes portadores


de fístulas digestivas.

A decisão entre nutrição parenteral ou enteral depende da localização e do


débito da fistula, mas prefere-se a nutrição enteral sempre que possível.
Geralmente nutrição parenteral é indicada em pacientes com fistulas
gastroduodenais, pancreáticas ou jejuno-ileais e para fístulas de alto débito;
enquanto que a nutrição enteral é preferida para fistulas esofágicas, gástricas,
de íleo distal e cólon.
Em geral a oferta calórica situa-se entre 25 a 30 kcal/kg/dia. A oferta protéica
situa-se entre 1,0 a 1,5 g/kg/dia. Pode ser maior naqueles pacientes que
apresentam grandes perdas protéicas, principalmente nas fístulas de alto
débito. Nesses casos a relação caloria/g de nitrogênio será reduzida de 150:1
para 100:1 mediante aumento da oferta protéica. Eletrólitos, vitaminas e
oligoelementos são adicionados à solução de acordo com as recomendações
usuais. Em pacientes com hipoalbuminemia grave (<2,5 g/dl) devem receber
albumina humana até que os valores sejam corrigidos.
A nutrição enteral é mais fisiológica, menos onerosa e permite a manutenção
do trofismo intestinal, evitando a atrofia intestinal e, consequentemente, a
ocorrência de translocação bacteriana. Caso ocorra aumento do débito da
fístula com o início da nutrição enteral o paciente deverá receber nutrição
parenteral.
Algumas fístulas colônicas distais, de baixo débito, podem ser tratadas
apenas com dieta pobre em resíduo. Entretanto, recentemente foi proposto
que a dieta rica em fibras pode ser benéfica nestes pacientes por melhorar o
trânsito intestinal e, consequentemente, reduzir a pressão intracolônica. Esta
conduta deverá ser reavaliada por estudos futuros.
Acompanhamento da Terapia Nutricional - É importante monitorar a resposta
diária do paciente ao suporte nutricional para assegurar aporte satisfatório de
nutrição parenteral ou enteral. O acompanhamento do progresso do paciente
inclui peso diário (se possível), medidas antropométricas semanalmente, bem
como análise bioquímica do sangue e da urina, e o monitoramento do débito
da fistula.
O controle laboratorial dos eletrólitos séricos, glicose, uréia e creatinina
devem ser realizados duas ou três vezes por semana, de acordo com a
estabilidade do paciente. Cálcio, fósforo, magnésio, zinco, albumina, provas
de função hepática, tempo de protrombina, tempo de tromboplastina parcial
ativada, hemograma com diferencial e contagem de plaquetas devem ser
realizados semanalmente.
A duração do suporte nutricional e do tratamento médico de apoio varia de
paciente para paciente. Cada caso deve ser individualizado e a decisão de
operar deve ser tomada após avaliação cuidadosa da evolução intra-
hospitalar do paciente e dentro do contexto da doença de origem e de
problemas clínicos apresentados. Durante o tempo de tratamento
conservador sempre pode ocorrer fechamento espontâneo da fistula. Mesmo
que este não ocorra, um período de quatro a seis semanas é um tempo
valioso para melhorar o estado nutricional do paciente e a sua condição geral
antes da cirurgia, permitindo a restauração do balanço nitrogenado positivo e
a resolução da inflamação.

Deve-se manter o tratamento conservador por 4-6 semanas antes de optar


pela intervenção cirúrgica.

No paciente portador de fistula do trato digestivo é preciso estabelecer


quando interromper a terapia nutricional. O momento do término do suporte
nutricional deve ser revisto regularmente para assegurar o máximo beneficio e
efetividade econômica com o mínimo prejuízo possível para o paciente. São
três as condições clínicas que indicam o momento de interrupção do suporte
nutricional:
• complicação que coloque em risco a vida do paciente. No caso da NPT, a
sepse confirmada com instabilidade hemodinâmica ou complicações
metabólicas graves, indicam interrupção do suporte nutricional, mesmo que
temporariamente.
• quando a meta de reabilitação nutricional for atingida. Atualmente não se
dispõem de parâmetros clínicos ou laboratoriais fidedignos que indiquem com
segurança a repleção nutricional ótima. Recomenda-se esperar que, após o
fechamento da fistula, o paciente tenha ingesta oral de 60% das suas
necessidades calculadas, para que se interrompa a terapia nutricional.
• a doença do paciente progrediu a um estado terminal irrecuperável. Nesse
tipo de situação a progressão do suporte nutricional torna-se agressivo e
injustificável.

O momento para a interrupção do suporte nutricional decerá levar em


consideração: estabilidade clínica, prognóstico e meta nutricional.

Pode-se concluir, portanto, que na maioria dos casos (60%) de fístulas


digestivas, o tratamento conservador com suporte nutricional será suficiente.
Quando o tratamento cirúrgico está indicado, a terapia nutricional permite
manter ou mesmo melhorar o estado nutricional dos pacientes, melhorando
suas defesas orgânicas e consequentemente aumentando as chances de
sucesso. Nutrição parenteral parece ser a forma mais simples para a
administração de suporte nutricional nos pacientes com fístula digestiva. No
entanto, em várias situações clínicas é possível a utilização de nutrição
enteral, como nas fístulas esofágicas cervicais ou nas fístulas colônicas.

O fechamento espontâneo da fístula pode ocorrer em 60% dos casos, quando


o paciente está sob suporte nutricional e a sepse está controlada.

TRATAMENTO CIRÚRGICO

O controle da infecção e o suporte nutricional adequados são os dois fatores


mais importantes no tratamento das fístulas digestivas. A maioria dos autores
recomenda reoperação em seis semanas caso a fístula não tenha fechado
neste período. Operação precoce aumenta o risco de lesão iatrogênica das
alças intestinais inflamadas durante a dissecção. As indicações cirúrgicas dos
pacientes com fístulas digestivas estão listadas no quadro 2. Em geral estes
procedimentos podem ser indicados como procedimento auxiliar para
assegurar à fístula condições propícias de fechamento ou a indicação
cirúrgica pode ter como objetivo o fechamento da fístula.

Tratamentos de emergência ou auxiliares - A primeira indicação de cirurgia é


para tratar infecção. Se o paciente for portador de peritonite generalizada com
sepse sistêmica por fístula digestiva a mortalidade pode chegar a 70%. Se o
paciente apresenta um abscesso simples a drenagem percutânea pode ser
suficiente para assegurar o tratamento da sepse, com baixa mortalidade. Em
pacientes com abscessos complexos a drenagem cirúrgica está indicada,
porém a mortalidade operatória destes pacientes em geral é superior a 30%.
Nestas operações as grandes dissecções aumentam a chance de lesão
iatrogênica, especialmente quando o intestino encontra-se inflamado e
bastante friável. Entretanto, toda a cavidade deve ser cuidadosamente
inspecionada, pois a não drenagem de um abscesso vai comprometer a
recuperação pós-operatória e a própria sobrevida do paciente.

Nos pacientes com fístula digestiva: peritonite + sepse = 70% mortalidade.

Dentre as indicações de emergência nos pacientes portadores de fístulas


digestivas, uma indicação rara porém potencialmente fatal é a hemorragia
pelo trajeto fistuloso. Estes sangramentos são mais frequentes nas fístulas
gástricas e duodenais, e a ressecção do trajeto é mandatória, apesar de nem
sempre ser possível.

Se for necessária a cirurgia em pacientes portadores de fístulas de esôfago,


estômago ou duodeno, deve ser realizado durante o procedimento uma
jejunostomia para utilizar o trato digestivo com nutrição enteral, reduzindo os
riscos e custos da nutrição parenteral.
Operações definitivas - Cada paciente deve ser individualizado e a decisão de
operar deve ser tomada após avaliação cuidadosa do problema como um
todo. De qualquer maneira, a maioria dos autores concorda que é
recomendável esperar-se o intervalo de 4-6 semanas para que ocorra
diminuição do processo inflamatório intra-abdominal e melhora do estado
nutricional.
A presença de fístulas múltiplas, principalmente se exteriorizadas pela ferida
operatória eviscerada, é problema de difícil solução. A mortalidade neste
grupo de pacientes varia de 25 a 60%. Nestes casos o fechamento
espontâneo é raro e a cirurgia é quase sempre necessária. Alguns autores
defendem a abordagem cirúrgica imediata nestes casos, enquanto outros
recomendam operação tardia, após tratamento clínico e nutricional
adequados.
Drenagem persistente da fístula é a indicação mais frequente de intervenção
cirúrgica em pacientes com fístula digestiva após o controle da sepse. O
tratamento cirúrgico definitivo não deve ser tentado em presença de infecção,
pois nestas condições a recorrência da fístula é frequente, disseminando a
infecção para toda a cavidade abdominal. Fechamento direto - Apesar de ser
tentador, o fechamento direto do orifício fistuloso apresenta índice elevado de
falha, acompanhando-se de alta mortalidade. A única possível exceção na
qual o procedimento pode ser empregado é nas pequenas fístulas terminais
crônicas do coto duodenal.
Procedimentos de exclusão - A exclusão da fístula, tanto parcial como total,
está indicada sempre que o campo operatório esteja relativamente livre de
contaminação e que a massa inflamatória formada pelo fístula e pelo intestino
adjacente envolvido seja bem localizada. Nestas condições, é prudente o
cirurgião evitar dissecções extensas da área inflamada para evitar lesão
acidental de alças intestinais e para não disseminar a contaminação para a
cavidade peritoneal. Este procedimento deve ser reservado para aqueles
pacientes de grande risco e portadores de câncer, doença de Crohn ou
enterite actínica. Nas fístulas gástricas e duodenais, o processo inflamatório
originado do débito contínuo oblitera os planos normalmente existentes entre
as extruturas vizinhas, e a mobilização e dissecção durante a reoperação
podem ser extremamente difíceis. Duodenojejunostomia em Y de Roux ou
duodenojejunostomia látero-lateral com jejuno-jejunostomia abaixo do
mesocólon podem ser empregados em casos selecionados.
Procedimentos de "remendo" ou patch - O remendo ou patch utilizando a
serosa de uma alça sobre a área da fístula tem sido empregado com sucesso
em alguns casos de fístula lateral do duodeno. A técnica é simples e rápida,
mas só parece justificada quando metade a dois terços da circunferência do
duodeno estão envolvidas e quando a parede duodenal parece segura para
ser suturada. A mucosa duodenal recobre a serosa da alça do remendo em
pouco tempo. Mesmo segmentos pediculados de jejuno ou íleo foram
empregados com sucesso para reparar lacerações duodenais extensas.
Ressecção primária - A maioria dos autores concorda que a ressecção
primária com ou sem anastomose término-terminal é o procedimento de
escolha para o tratamento definitivo das fístulas gastrointestinais. Este
procedimento tem índice de sucesso de 89%. A anastomose primária é
desejável durante a primeira operação, mas esta pode não ser possível
devido a condições locais. É importante que a ressecção não seja muito
extensa para se evitar o intestino curto.

A ressecção primária é o procedimento de escolha para o tratamento


definitivo da fístula gastrointestinal.

Procedimentos reconstrutivos - Fístulas múltiplas, principalmente se


exteriorizadas em áreas evisceradas e infectadas são de difícil manejo. A
presença da fístula na incisão impede a sua cicatrização, o que pode ser
agravado em casos onde foi utilizada a laparostomia e que haja material
estranho, como telas ou pontos totais de retenção. Este procedimento só
pode ser empregado quando a fístula foi controlada e as alças expostas
foram cobertas com tecido de granulação. Em grandes defeitos da parede
abdomial pode ser empregado inclusive enxertos musulocutâneos incluindo o
músculo reto abdominal.

PROGNÓSTICO

O prognóstico de um paciente que apresenta uma fístula digestiva vai


depender de aspectos gerais e específicos relacionados com o paciente e
com a fístula. Portanto, as generalizações de conceitos são difíceis devido à
grande variabilidade dos casos de fístulas.

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